Michel Temer envia carta a Dilma

O vice-presidente da República, Michel Temer, enviou carta “confidencial e pessoal” à presidente Dilma Rousseff. O conteúdo dela, no entanto, foi divulgado na imprensa e causou constrangimento a todas as partes. Na carta, Temer acusa Dilma de nunca ter confiado nele, e de ter sido tratado como um “vice decorativo”.

A missiva do vice-presidente elenca 11 situações em que isso teria sido demonstrado, incluindo deixar de ser chamado para reuniões, não ser ouvido em assuntos importantes, ser ignorado enquanto vice-presidente da República e presidente do PMDB nas tratativas com parlamentares do partido. Mais ainda, revela que parte de seu desconforto vem de Dilma não ter se preocupado em manter ministros indicados por ele — sem querer revelando que o governo não usou tanto assim os cargos como moeda para compra de apoio político, como foi aventado na última reforma ministerial.

Segundo Temer revelou a jornalista de O Globo, a carta foi entregue em mãos a sua chefe de gabinete, para que a entregasse à presidência da República. O vice-presidente acusa a presidência de ter vazado o conteúdo dela.

No entanto, nem todo o PMDB expressa mágoas em relação à presidente. Nas palavras do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (também do PMDB):

Não tenho poder nenhum para mediar uma conversa entre os dois e não acredito que o Temer esteja se afastando. Não acredito na ruptura. Minhas posições são claras e acho que o impeachment é um desserviço num momento de tão grande crise. O PMDB ajudou a eleger a presidente e agora tem de ajudar a governar.

Opinião de Visão Católica

Independente de qualquer avaliação sobre a veracidade do que está expresso na carta de Michel Temer a Dilma Rousseff, ou então de quem  a divulgou e por qual razão, um fato parece transparecer do texto: o PT está colhendo o que plantou em sua relação com os aliados.

No início do ano, o PT tentou impor um candidato à presidência da Câmara dos Deputados, mesmo tendo uma bancada menor que a peemedebista. Aconteceu que Eduardo Cunha (PMDB-RJ) não apenas foi eleito, mas passou a se opor ao governo petista. Isso abriu espaço para que, aliando-se à oposição, acatasse um pedido de impeachment muito semelhante a outro que já havia sido rejeitado por ele mesmo. E não é a primeira vez. Basta olhar para o passado, e ver a eleição de Severino Cavalcanti (PP) para a presidência da Câmara em 2005, um processo muito semelhante, em situação igualmente delicada. Cavalcanti renunciou ao mandato meses depois, após denúncias de corrupção, algo que Cunha se recusa a fazer.

Isso tudo me lembra uma ocasião em que, presidindo um debate com Markus Sokol, da corrente O Trabalho, do PT, pude questioná-lo a respeito da visão petista da política brasileira nos últimos 20 anos (na época). Ele havia mencionado em sua fala que o PT seria uma “necessidade histórica”, bem aos moldes de um certo marxismo. Questionei o porquê dessa afirmação, pois, na época em que o partido foi fundado, havia alternativas, desde os grupo de Brizola até o PCdoB, passando pelo grupo de Miguel Arraes e pelo PCB, por exemplo. A resposta foi de que a história estava aí para mostrar: o PT passara a ser maior que esses outros grupos.

Ou seja: a visão petista da política brasileira diz que o Partido dos Trabalhadores é uma “necessidade histórica”, o destino manifesto do PT é governar o Brasil e suplantar as “velhas” formas de  política e de sindicalismo representadas pelos outros grupos. O petismo está imbuído, enfim, de um menosprezo pelos demais grupos políticos, especialmente de um menosprezo por seus aliados. O PT colhe o que plantou.

A íntegra da carta está disponível em http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/12/leia-integra-da-carta-enviada-pelo-vice-michel-temer-dilma.html

(Foto em destaque: Michel Temer, por Romério Cunha/VPR.)

Rússia ajuda a libertar cidades do EI; Turquia derruba avião russo

Avião militar russo abatido pela Turquia cai na Síria.
Avião militar russo abatido pela Turquia cai na Síria.

O exército da Síria retomou, com ajuda da aviação militar russa, as cidades de Mheen e Hawwarin, até então sob domínio do Estado Islâmico (EI) — a informação foi divulgada ontem (23) pelo Observatório Sírio dos Direitos Humanos. Hoje (24), a Turquia derrubou um avião militar russo modelo SU-24, que caiu perto de Idlib, na Síria, cidade que fica a cerca de 25Km da fronteira turco-síria. Segundo o governo turco, teria havido violação do espaço aéreo da Turquia; a Rússia afirma que a aeronave permaneceu todo o tempo no espaço aéreo sírio, onde, afinal, caiu. A Turquia pediu a criação de uma zona de exclusão aérea na fronteira entre Síria e Turquia, o que inviabilizaria ataques aéreos ao Estado Islâmico na região, incluindo a cidade de Dabiq, onde o EI espera haver uma intervenção divina para expandir seu califado.

Mapa da região onde a Turquia derrubou o avião militar russo. Em vermelho, a fronteira turco-síria. A cidade de Idlib em cujas cercanias o avião caiu, fica a cerca de 25Km da Turquia. Fonte: Google Maps.
Mapa da região onde a Turquia derrubou o avião militar russo. Em vermelho, a fronteira turco-síria. A cidade de Idlib (marca vermelha) em cujas cercanias o avião caiu, fica a cerca de 25Km da Turquia. Clique na imagem para ampliar. Fonte: Google Maps.

Embora a Rússia tenha tomado partido do governo de Bashar al-Assad, atacando também grupos rebeldes não alinhados ao Estado Islâmico, a derrubada do avião russo no Egito por partidários do EI levou a uma inflexão em sua estratégia, intensificando os ataques diretos ao território controlado pelo califado. A região onde caiu o avião russo, porém, é controlada por grupos que se opõem a Assad, mas não pertencem ao EI. Um dos tripulantes da aeronave teria sido assassinado por esses rebeldes.

“A perda de hoje é uma facada nas costas que foi dada pelos cúmplices dos terroristas”, disse o presidente russo, Vladimir Putin, em referência à Turquia. Disse ainda que “os eventos trágicos de hoje vão ter consequências sérias nas relações russo-turcas” e que “nosso avião, nossos pilotos, não ameaçavam a Turquia”.

Opinião de Visão Católica

Não é a primeira vez que a Turquia ataca forças que se opõem ao Estado Islâmico. Nesse ano mesmo, após um ataque terrorista contra curdos e apoiadores da causa curda na Turquia, esse país bombardeou o curdos na Síria, a pretexto de combater o terrorismo. Os curdos, porém, não eram apenas vítimas, mas são um dos principais grupos opositores do EI. Na ocasião, Visão Católica publicou Turquia ataca os inimigos do Estado Islâmico.

A emergência do Estado Islâmico só foi possível graças à desagregação das sociedades iraquiana e síria após a invasão americana do Iraque em 2003 e a promoção da mal chamada “Primavera Árabe” (2010-2011) pelas potências reunidas na OTAN. Nesses lugares, em meio à crise, à desagregação e à desesperança, frutificou um movimento messiânico islamista, que procura provocar uma “batalha final” em Dabiq, na Síria, em que uma intervenção divina salvaria as tropas muçulmanas contra “Roma”, e iniciaria a expansão final do califado até que Jesus voltasse — os muçulmanos consideram Jesus um mero profeta.

Tendo origem na desagregação social, a batalha “final” contra o EI só poderá acontecer quando as sociedades iraquiana e síria voltarem a se reunir como uma comunidade. Por isso, é preciso levar em consideração os governos locais, que têm apoio de parcela considerável da população, mas também os grupos rebeldes que não procurarem implementar suas próprias visões de califado ou de submissão das demais parcelas da população. Uma vitória militar, mesmo sendo uma etapa necessária, não chegará a acabar com o pavio que incendiou o Levante. É preciso reconciliação e a harmonia social, em que cada povo, religião ou estrato social tenha voz e seja ouvido. Isso poderá criar a esperança, que é o verdadeiro antídoto para visões de mundo como a do Estado Islâmico.

Estatuto da Família aprovado na Câmara

A Câmara dos Deputados aprovou ontem (24), em votação em comissão especial, o projeto de lei que institui o Estatuto da Família, de autoria do deputado Anderson Ferreira (PR-PE), com o objetivo de assegurar políticas públicas voltadas para a família, a criação de conselhos de políticas públicas para a família, a prioridade a ser dada em casos que envolvam a manutenção do núcleo familiar e a sua participação nas decisões escolares, por exemplo. O projeto define família como “núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

Em 1.º de julho deste ano, o Conselho de Direitos Humanos da ONU (CDH) aprovou resolução nesse mesmo sentido. Votaram a favor da proteção dela os países árabes e muçulmanos, os países africanos (exceto África do Sul), a Rússia, os países socialistas, a Venezuela, a Bolívia, o Paraguai, e os países asiáticos (exceto Coréia do Sul e Japão). O Brasil se absteve. Os países europeus e os EUA foram contra a resolução. Ontem, na Câmara dos Deputados, PT, PCdoB, PTN e PSol se revezaram na tentativa de adiar a votação, por serem contra o projeto. Para eles, definir família como união de um homem e uma mulher seria uma “discriminação” contra outras “formas de família” — a mesma postura foi adotada por países europeus na CDH. Em ambos os casos, aprovaram-se projetos que simplesmente defendem a família natural, sem prejudicar quem não faça parte dela.

Se não for apresentado recurso, o Estatuto da Família seguirá diretamente para apreciação do Senado Federal. Se aprovado, poderá virar lei caso seja sancionado pela presidente da República. Se for apresentado recurso, ele deverá ser votado ainda no plenário da Câmara dos Deputados.

Opinião de Visão Católica

A mixórdia de grupos contra e a favor do Estatuto da Família e da resolução da ONU demonstram como a questão é complicada e deve ser tratada com sabedoria. A postura de definir família como união de um homem e uma mulher é, evidentemente, correta e natural. Contudo, apresentam-se contrariamente aqueles que adotam o moderno relativismo, um componente capital no liberalismo que grassa a Europa e fincou raízes na América. Curiosamente, no Brasil são grupos socialistas e de esquerda que levantam a bandeira liberal, enquanto na Europa, e na América do Norte são os países de capitalismo mais desenvolvido que o fazem.

A questão vai muito além do simplismo de alguns grupos (inclusive alguns que se dizem cristãos) a respeito de um suposto “marxismo cultural” querendo destruir a família. O papel do liberalismo (que é uma das raízes do socialismo), nesse caso, fica cabalmente demonstrado: promotor de tudo o que for antinatural e anti-eclesial, pois a Lei Natural e a Igreja são o alvo principal de doutrinas que dizem que tudo deve ser permitido (liberalismo) ou que tudo deriva da ação humana (uma visão do materialismo histórico). Curiosamente, Cuba, China e Vietnã, que são países socialistas, votaram a favor da família na ONU — afinal de contas, é de reconhecer que o materialismo comporta algum espaço para a ordem natural (material), e, nesses países, os partidos comunistas não dependem de grupos minoritários para sobreviver.

(Foto em destaque: sessão da comissão especial que aprovou o Estatuto da Família, em 24/09/2015. Gilmar Felix/Câmara dos Deputados.)

Doações de empresas a campanhas e partidos políticos são inconstitucionais, diz STF

O Supremo Tribunal Federal concluiu ontem (17) o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) n.º 4650, que procurava declarar inconstitucional a doação de empresas a partidos políticos e campanhas eleitorais. O resultado, por oito votos a três, impede que empresas façam essas doações.

O argumento central da maioria dos ministros foi de que a Constituição Federal, em seu artigo 14, parágrafo 9.º estabelece que será combatida a influência do poder econômico sobre as eleições:

Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

(Constituição Federal, art.º 14, § 9.º)

O relator do processo, ministro Luiz Fux, afirmou ainda que não há perspectiva de que a medida aumente o uso de doações não declaradas, o “caixa dois”: “O panorama atual mostra o quão arriscado é fazer o ‘caixa dois’ e ser descoberto depois, de modo que há um desestímulo. Sem prejuízo, na audiência pública [sobre doação eleitoral] nós tivemos informações de que tudo o que as empresas gostariam é de se ver livres dessa contribuição”, disse ele.

Sobre a possibilidade de edição de novas leis ou emendas à Constituição que visem a permitir a doação por empresas, tanto o relator do processo quanto o presidente do STF (Ricardo Lewandowski) afirmaram que deverão ter o mesmo destino dos dispositivos atuais, declarados inconstitucionais. Segundo Lewandowski:

O julgamento do STF, todos assistiram, baseou-se em princípios constitucionais. Baseou-se no princípio da igualdade de armas, baseou-se no princípio da isonomia, baseou-se no princípio da democracia, baseou-se no princípio republicano, baseou-se no parágrafo 9º do artigo 14 da Constituição, que fala da normalidade das eleições. Então, qualquer lei que venha possivelmente a ser sancionada ou não, ou que venha a ser aprovada futuramente e que colida com esses princípios aos quais o STF se reportou e com base nos quais se considerou inconstitucional a doação de pessoa jurídicas para campanhas políticas, evidentemente terá o mesmo destino.

Opinião de Visão Católica

As doações empresariais a campanhas eleitorais e a partidos políticos estão no cerne de vários escândalos de corrupção, inclusive da operação Lava-Jato. A vedação delas era um dos pontos centrais da proposta da Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, liderada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Essa decisão terá profundos impactos nas próximas campanhas eleitorais, após um cenário em que a disputa do voto se baseava quase que exclusivamente em exorbitantes doações de empresas. Nas últimas eleições presidenciais, por exemplo, os dois candidatos que foram ao segundo turno gastaram mais de R$ 577 milhões, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral. Agora pode vir a ter mais impacto o apoio dos eleitores aos candidatos de sua preferência — no fim das contas, não deveriam ser mesmo os eleitores a decidir?

(Foto em destaque: sessão do STF no dia 17/09/2015. Foto: Nelson Jr./SCO/STF.)

Movimentos sociais no planalto pela continuidade institucional

Movimentos sociais se reuniram ontem (13) no Palácio do Planalto com a presidente da República, Dilma Rousseff e com o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto. No evento, chamado Diálogo com os Movimentos Sociais, a tônica foi a da defesa da continuidade do mandato de Dilma até 2018 e pelo aprofundamento das mudanças introduzidas nos governos petistas.

A presidente Dilma Rousseff participa do evento Diálogo com os Movimentos Sociais, no Palácio do Planalto. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
A presidente Dilma Rousseff participa do evento Diálogo com os Movimentos Sociais, no Palácio do Planalto. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Os movimentos sociais também demarcaram as diferenças com os que pretendem interromper o mandato de Dilma Rousseff. Guilherme Boulos, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, chamou-os de “golpistas que se utilizam da insatisfação social para impor o seu projeto político e para atacar a democracia”. Segundo Carina Vitral, presidente da UNE, “para ter impeachment precisa ter crime de responsabilidade, e sabemos que, contra a presidenta, não há qualquer indício ou acusação”. O presidente da CUT, Vagner Freitas, disse que “o que se vende hoje no Brasil é a intolerância, o preconceito de classe contra nós. Somos defensores da unidade nacional, de um projeto nacional.”

Pautas sociais

Por outro lado, projetos de interesse dos movimentos sociais também foram debatidos. Raimundo Bonfin, da Central dos Movimentos Populares afirmou que o governo “tem de taxar as grandes fortunas e combater de forma dura a sonegação fiscal”, fazendo menção ainda a manifestações ocorridas este ano em que a sonegação fiscal foi defendida pelos opositores: disse que songação “é corrupção, sim, porque tira dinheiro dos programas sociais e do desenvolvimento econômico.” Também foi defendida a universalidade do Sistema Único de Saúde, o orçamento da educação, o programa Minha Casa, Minha Vida, os povos e comunidades tradicionais.

Por outro lado, foi criticada a “Agenda Brasil“, proposta pelo presidente do Senado Federal, Renan Calheiros. Também foram criticados o presidente da Câmara dos Deputados e a política econômica — personificada no ministro da Fazenda, Joaquim Levy: “Fora já, fora já daqui, o Eduardo Cunha junto com o Levy”, repetiam os presentes.

Senadores independentes

Em outra frente política, também ontem os senadores independentes Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), Cristovam Buarque (PDT-DF), João Alberto Capiberibe (PDT-AP), Lídice da Mata (PSB-BA) e Lasier Martins (PDT-RS) se reuniram com Dilma Rousseff e defenderam a formação de um governo de união nacional. Na ocasião, Dilma elogiou o papel do Senado na crise atual, afirmando que a casa legislativa tem agido como “poder moderador”.

Opinião de Visão Católica

Tanto os movimentos sociais quanto os senadores do PDT, do PSB e até do PSOL defenderam “união nacional”. Mas, sempre de acordo com os seus interesses. Os movimentos sociais, por exemplo, têm acirrado em seu discurso a divisão de classes — que, embora exista e seja vista nas manifestações de rua que vêm ocorrendo ao longo do ano, não tende a produzir bons frutos, ao contrário, pode ter um resultado bastante danoso à democracia e aos interesses dos próprios movimentos sociais. O acirramento dos conflitos políticos tem evidentemente produzido intolerância (como eles mesmos denunciaram), até mesmo com atentados com bombas incendiárias contra sedes do PT e do Instituto Lula.

A violência tem crescido na política brasileira, e está presente especialmente nas manifestações da oposição, com bonecos enforcados, ameaças de magnicídio e atentados terroristas (porque as tentativas de incendiar sedes de instituições adversárias é terrorismo na sua acepção mais pura). E deve ser combatida. Porém, é aconselhável que o combate não se dê pelo acirramento dessa clivagem, já tão danosa, e o discursos dos movimentos sociais têm que ficar atentos a isso. Se pregam a união nacional, então, mesmo demarcando diferenças, não devem seguir verbalmente o caminho que os opositores têm seguido também materialmente.

As falas dos movimentos sociais podem ser lidas com mais detalhes na Agência Brasil.

Turquia ataca os inimigos do Estado Islâmico

Após sofrer um atentado terrorista na semana passada, atribuído ao Estado Islâmico (EI), e que teve simpatizantes dos curdos da Síria como alvo, a Turquia vem atacando fortemente as forças curdas — inimigas do Estado Islâmico — tanto em seu território quanto fora dele. Hoje (27), foi a vez de um ataque de artilharia contra a cidade síria de Zur Maghar, controlada pelas Unidades de Proteção Popular Curdas. Quatro pessoas foram mortas, todas pertencentes a um grupo aliado aos curdos.

Os curdos têm tido um papel proeminente no combate ao Estado Islâmico na Síria e no Iraque, e seu território vem se tornando refúgio de muitos cristãos que fogem do califado. A Turquia, por outro lado, vem sendo constantemente acusada de dar passagem livre aos estrangeiros que vão se juntar ao Estado Islâmico, e até mesmo a armas, munição com destino aos jihadistas.

A etnia curda reclama há muitos anos a criação de um Estado independente no norte do Iraque e da Síria e sul da Turquia, chamado “Curdistão”. Com a débâcle do Estado iraquiano, ganharam na prática alguma autonomia, e hoje são uma das poucas forças locais capazes de combater o califado proclamado por Al Baghdadi. Por esse mesmo motivo, o Curdistão se tornou refúgio de minorias, inclusive cristãos expulsos pelo EI.

Opinião de Visão Católica

A Turquia não tem atuado contra o Estado Islâmico. Membro da OTAN com maioria muçulmana, vizinha da região do conflito, poderia demonstrar ao mundo, e especialmente aos muçulmanos, que o combate ao Estado Islâmico é um combate pela humanidade, e não contra a religião que o EI afirma defender. Contudo, a reação da Turquia após o atentado da semana passada em Suruç demonstra que a Turquia tem tentado usar o conflito no Iraque e na Síria para enfraquecer os curdos, vistos como um inimigo interno. Isso, porém, pode levar ao fortalecimento do califado de Al Baghdadi, e sua conseqüente expansão para outros países de maioria muçulmana, inclusive a Turquia.

Intelectuais armênios assassinados a 24 de abril de 1915 (Fonte: Wikimedia)
A Turquia teima em não repudiar os atos do Império Turco-Otomano e do antigo califado. Na foto, intelectuais armênios assassinados a 24 de abril de 1915 (Fonte: Wikimedia)

Para complicar a situação, a Turquia foi a sede do califado anterior, extinto sob o governo do coronel Ataturk em 1924. Esse califado foi o responsável pela expansão do islamismo para o sudeste da Europa e pelo domínio de vastas áreas cristãs. Também foi o responsável, junto com o governo turco-otomano, pelo genocídio dos armênios durante a Primeira Guerra Mundial — evento até hoje defendido como uma questão de honra pelos governos turcos.

Mas, o califa é para os muçulmanos sunitas o legatário de Deus, e não pode haver dois califados. Se a Turquia quer se manter independente do Estado Islâmico, deve combatê-lo. E este já avisou que não reconhece nenhum governo secular, nem mesmo o turco.

(Imagem destacada: blindado turco em serviço a partir deste ano. Foto: Karaahmet/Wikimedia.)

EUA e Cuba reabrem embaixadas

Após décadas de hostilidades, que incluíram invasões militares, transmissões clandestinas de rádio e televisão, atos de terrorismo – promovidos pelos EUA – e disputa ideológica de ambas as partes, Estados Unidos da América e Cuba reabriram hoje (20) suas embaixadas. Ainda não é a normalização completa das relações, que o presidente cubano condiciona a novas atitudes por parte do homólogo norte-americano, mas é mais um passo significativo na direção da integração e da abertura, iniciados ano passado.

Seção de interesses norte-americanos em Cuba, agora oficialmente uma embaixada. Foto: Escla/Wikimedia.
Seção de interesses norte-americanos em Cuba, agora oficialmente uma embaixada. Foto: Escla/Wikimedia.

Segundo a Agência Lusa, entre as exigências cubanas estão o fim do bloqueio comercial imposto pelos EUA, a devolução da base naval norte-americana em Guantânamo (Cuba), o fim das transmissões clandestinas de rádio e televisão a partir de equipamentos militares norte-americanos, o fim de programas que dão apoio a opositores do regime cubano, e a compensação pelos danos humanos e econômicos causados pelas políticas norte-americanas.

A reaproximação entre os países teve um dedo da Igreja Católica, mas o papa Francisco disse no retorno de sua viagem pastoral à América do Sul que “o mérito é deles, que fizeram isto. Nós não fizemos quase nada.” Houve, no entanto, meses de oração e uma missão cardinalícia com esse propósito. Em setembro o papa viajará a Cuba e aos Estados Unidos da América, incluindo um pronunciamento na Assembléia Geral das Nações Unidas.

Maioridade penal: OAB diz que redução viola a Constituição

Constitucionalmente, a matéria rejeitada não pode ser votada no mesmo ano legislativo. A redução da maioridade, que já possuía a inconstitucionalidade material, porque fere uma garantia pétrea fundamental, passa a contar com uma inconstitucionalidade formal, diante deste ferimento ao devido processo legislativo.

Parlamentar denuncia golpe que levou à aprovação da redução da maioridade penal na Câmara dos Deputados. Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados.
Parlamentar denuncia golpe que levou à aprovação da redução da maioridade penal na Câmara dos Deputados. Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados.

Essa é a posição oficial da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), expressa em nota divulgada ontem (2), após a aprovação de uma emenda aglutinativa sobre uma matéria que já havia sido derrotada na Câmara dos Deputados: a redução da maioridade penal. No dia 30, os 303 deputados votaram pela redução da maioridade, 5 a menos do que os 308 votos necessários para mudar a Constituição Federal. No dia seguinte, 323 votaram pela redução.

Diante do cenário, a OAB e mais 7 partidos políticos ingressarão com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para declarar a inconstitucionalidade da votação. O ministro Marco Aurélio Mello já se pronunciou contrário à forma como foi aprovada a redução.  “A matéria constante de Proposta de Emenda à Constituição rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. E nesse período muito curto de 48 horas, não tivemos duas sessões legislativas”, disse o ministro do STF. Ele também é contra a redução da maioridade. Também o ministro do STF aposentado Joaquim Barbosa se manifestou publicamente contra a redução e contra a forma como aconteceu a votação. A Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), igualmente se posicionou contrária à medida: “não se pode alterar o que está estabelecido pelo artigo 228 da Constituição Federal; e o artigo 60, que trata de emenda à Constituição, veda a deliberação sobre matéria que tente abolir direito ou garantia individual”.

Opinião de Visão Católica

Visão Católica já havia alertado sobre a ameaça que ainda pairava sobre o povo brasileiro, visto que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, prometera insistir na matéria, como já fizera com o financiamento empresarial de campanhas eleitorais (assim como a redução da maioridade, ele foi rejeitado na primeira votação, mas aprovado na segunda).

Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, durante sessão que aprovou a redução da maioridade penal. OAB, AMB, ministros do STF e partidos políticos dizem que a manobra foi inconstitucional. Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados.
Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, durante sessão que aprovou a redução da maioridade penal. OAB, AMB, ministros do STF e partidos políticos dizem que a manobra foi inconstitucional. Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados.

O mandato de presidente da Câmara dos Deputados é curto (apenas dois anos), mas, já no primeiro quarto dele, Eduardo Cunha fez um grande estrago. Sempre empurrando suas próprias prioridades e posicionamentos políticos, ele seguidamente aprovou a ampliação da terceirização, o financiamento empresarial de campanhas eleitorais e a redução da maioridade penal. Nos dois últimos casos, colocando novamente em votação temas que antes não haviam conseguido os votos necessários para a aprovação. Felizmente essas propostas ainda tramitarão no Senado Federal, que poderá rejeitá-las.

A agenda de Eduardo Cunha é contrária à Doutrina Social da Igreja e ao Evangelho de Jesus Cristo. O cristão, como indivíduo e como cidadão, deve privilegiar os pobres e socorrer os mais necessitados. Deve agir com misericórdia, e não com espírito de vingança ou em benefício próprio. Amar o próximo como a si mesmo é mandamento divino (Mt 22,39). “Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes” dirá Jesus Cristo quando retornar em sua glória para julgar os vivos e os mortos (Mt 25,40).

Lembremo-nos, enfim, das palavras que o Espírito Santo inspirou na Santa Mãe de Deus:

O Poderoso fez por mim maravilhas
e Santo é o seu nome!
Seu amor, de geração em geração,
chega a todos que o respeitam;
demonstrou o poder de seu braço, *
dispersou os orgulhosos;
derrubou os poderosos de seus tronos *
e os humildes exaltou;
De bens saciou os famintos, *
e despediu, sem nada, os ricos.

(Lc 1,49-53)

Maioridade penal: proposta de redução é derrotada, mas ameaça continua

A Câmara dos Deputados votou ontem o parecer do deputado Laerte Bessa (PR-DF) pela redução da maioridade penal para crimes hediondos. Foram 303 votos favoráveis à redução, mas seriam necessários 308. Houve 184 votos contrários e 3 abstenções. No site da Câmara dos Deputados é possível ver como votou cada deputado.

Contudo, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, disse que é “obrigado a votar a PEC original para concluir a votação ou o que os partidos apresentarem. No curso da votação, poderão ser apresentadas várias emendas aglutinativas. A votação ainda está muito longe de acabar, foi uma etapa dela”. Como a redução da maioridade penal é uma de suas bandeiras políticas, não deve demorar para que essas novas votações ocorram.

A CNBB, a Unicef, movimentos sociais e os ministros da justiça, José Eduardo Cardozo, e da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Pepe Vargas, participaram ontem da intensa mobilização pela manutenção da maioridade aos 18 anos e pelo aprimoramento das medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Para a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, “O caminho para pôr fim à condenável violência praticada por adolescentes passa, antes de tudo, por ações preventivas como educação de qualidade, em tempo integral; combate sistemático ao tráfico de drogas; proteção à família; criação, por parte dos poderes públicos e de nossas comunidades eclesiais, de espaços de convivência, visando a ocupação e a inclusão social de adolescentes e jovens por meio de lazer sadio e atividades educativas; reafirmação de valores como o amor, o perdão, a reconciliação, a responsabilidade e a paz.”

(Foto em destaque: adolescentes infratores no antigo Centro de Atendimento Juvenil Especializado — CAJE —, em Brasília. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Nova batalha sobre a maioridade penal

Deve ser votada hoje (30), no plenário da Câmara dos Deputados, a PEC 171/1993, proposta de emenda à Constituição que tenta reduzir para 16 anos a maioridade penal. Hoje, dos 12 aos 17 anos o adolescente pode sofrer somente as sanções previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), chamadas “medidas socioeducativas”. A Igreja Católica e a Unicef são contrárias à redução, e um estudo recente do IPEA demonstrou as possibilidades de reeducação presentes na atual legislação, ainda não completamente implementada, e como o poder judiciário vem preferindo a mera punição do jovem infrator.

Adolescentes infratores no antigo Centro de Atendimento Juvenil Especializado (CAJE), em Brasília. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Adolescentes infratores no antigo Centro de Atendimento Juvenil Especializado (CAJE), em Brasília. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Segundo o estudo do IPEA, na atual legislação “não há isenção da responsabilização face ao ato infracional praticado, uma vez que as medidas socioeducativas são as sanções aplicadas quando a contravenção é praticada por adolescentes. Entretanto, seu caráter pedagógico busca criar condições para a construção/reconstrução de projetos de vida que visem à ruptura com a prática do ato infracional por parte de adolescentes e jovens.”

Para a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), “a comoção não é boa conselheira e, nesse caso, pode levar a decisões equivocadas com danos irreparáveis para muitas crianças e adolescentes, incidindo diretamente nas famílias e na sociedade. O caminho para pôr fim à condenável violência praticada por adolescentes passa, antes de tudo, por ações preventivas como educação de qualidade, em tempo integral; combate sistemático ao tráfico de drogas; proteção à família; criação, por parte dos poderes públicos e de nossas comunidades eclesiais, de espaços de convivência, visando a ocupação e a inclusão social de adolescentes e jovens por meio de lazer sadio e atividades educativas; reafirmação de valores como o amor, o perdão, a reconciliação, a responsabilidade e a paz.”

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) faz parte da campanha contra a redução da maioridade. Em vídeo divulgado no Youtube, a Unicef diz que “A solução para o problema da violência no país é criar oportunidades para que os adolescentes possam desenvolver seus talentos, realizar seus sonhos, mas sem praticar delitos.” E acrescenta: “redução não é a solução”.

Discussão na Câmara dos Deputados

Na Câmara, o relator da proposta, Laerte Bessa (PR-DF), está irredutível. “Não tem negociação alguma”, disse ele. Já o ministro da justiça, José Eduardo Cardozo, deve ir hoje debater o assunto na CPI da Violência contra Jovens Negros e Pobres. O líder do PT na Câmara, deputado Sibá Machado (AC), por sua vez, alerta que a redução da maioridade penal poderia reduzir também outras idades, como a de dirigir. Para ele, “os agenciadores de pedofilia também poderão antecipar suas ações em dois anos suas ações”.

Grupos contra a  PEC da redução da maioridade penal estão acampados  em frente ao Congresso Nacional. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Grupos contra a PEC da redução da maioridade penal estão acampados em frente ao Congresso Nacional. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

No Salão Verde da Câmara dos Deputados deverá acontecer ainda uma entrevista coletiva com o ministro da Secretaria Nacional de Direitos Humanos (Pepe Vargas), uma consultora da Unicef (Casimira Benge) e representantes da CNBB. Esperam convencer deputados que ainda estão indecisos.

Por todo o dia de hoje, manifestantes em Brasília se mostraram contrários à redução da maioridade penal. Alguns acamparam no gramado em frente ao Congresso Nacional.