CNBB lança nota sobre o momento vivido pelo país

Ao final de sua 53.ª Assembléia Geral, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil lançou nota onde denuncia o risco à ordem democrática vigente desde a Constituição Cidadã de 1988 e insta os três poderes a trabalharem em espírito de diálogo para a promoção do bem comum.

Os principais aspectos abordados pelos bispos:

  • Obras na Amazônia afrontam a população, por não ouvi-la, e por favorecer o desmatamento e a degradação ambiental.
  • Deputados discutem terceirização (Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)
    Deputados discutem terceirização antes de aprovar redação final do PL 4.330/2004. (Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

    A lei da terceirização “não pode, em hipótese alguma, restringir os direitos dos trabalhadores. É inadmissível que a preservação dos direitos sociais venha a ser sacrificada para justificar a superação da crise.”

  • A corrupção é pecado grave que brada aos céus, e está presente tanto no Estado quanto na sociedade civil. Punir corruptos e corruptores é dever do Estado. Deve-se recuperar cultura que prime pelos valores da honestidade e retidão.
  • A credibilidade política não pode ser recuperada com aprovação de leis que retirem direitos dos mais vulneráveis. Lamentam que no Congresso se formem bancadas que se opõem aos direitos e conquistas sociais dos mais pobres.
  • A Igreja no Brasil se opõe à proposta de emenda à Constituição 215/2000, que torna atribuição do Congresso Nacional a demarcação de terras indígenas e a ratificação das já existentes (hoje a competência é do governo federal).
  • Cartaz
    Cartaz da Pastoral da Juventude da CNBB contra a redução da maioridade penal.

    A redução da maioridade penal “não é solução para a violência que grassa no Brasil e reforça a política de encarceramento num país que já tem a quarta população carcerária do mundo. Investir em educação de qualidade e em políticas públicas para a juventude e para a família é meio eficaz para preservar os adolescentes da delinquência e da violência.” O erro da aprovação da PEC 171/1993 na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados (CCJC) “é um equívoco que precisa ser desfeito”.

  • Em vez de reduzir a maioridade penal, o caminho é aplicar corretamente as sanções e as políticas públicas preconizadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). É preciso criar mecanismos para responsabilizar os gestores públicos que não aplicarem o ECA.
  • O Estatuto do Desarmamento deve ser preservado, a sensação de segurança conferida pelas armas é ilusão. O interesse econômico da indústria de armas não pode ser alimentado à custa de vidas humanas.
  • A Reforma Política Democrática, subscrita pela CNBB, é caminho para resolver muitos desses problemas.

Vê-se, portanto, ênfase na proteção dos direitos dos menos favorecidos e a oposição à ampliação da terceirização. Os direitos dos indígenas e a promoção da ética são pontos diretamente abordados pelo documento. A redução da maioridade penal, já aprovada pela CCJC, “é um equívoco que precisa ser desfeito”, o caminho é aplicar corretamente o Estatuto da Criança e do Adolescente. O Estatuto do Desarmamento deve ser preservado, e a reforma política é caminho para solucionar muitos dos problemas vividos pelo Brasil.

Leia na íntegra o que disseram os bispos:

“Entre vós não deve ser assim” (Mc 10,43).

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, reunida em sua 53ª Assembleia Geral, em Aparecida-SP, no período de 15 a 24 de abril de 2015, avaliou, com apreensão, a realidade brasileira, marcada pela profunda e prolongada crise que ameaça as conquistas, a partir da Constituição Cidadã de 1988, e coloca em risco a ordem democrática do País. Desta avaliação nasce nossa palavra de pastores convictos de que “ninguém pode exigir de nós que releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional, sem nos preocupar com a saúde das instituições da sociedade civil, sem nos pronunciar sobre os acontecimentos que interessam aos cidadãos” (EG, 183).

O momento não é de acirrar ânimos, nem de assumir posições revanchistas ou de ódio que desconsiderem a política como defesa e promoção do bem comum. Os três poderes da República, com a autonomia que lhes é própria, têm o dever irrenunciável do diálogo aberto, franco, verdadeiro, na busca de uma solução que devolva aos brasileiros a certeza de superação da crise.

A retomada de crescimento do País, uma das condições para vencer a crise, precisa ser feita sem trazer prejuízo à população, aos trabalhadores e, principalmente, aos mais pobres. Projetos, como os que são implantados na Amazônia, afrontam sua população, por não ouvi-la e por favorecer o desmatamento e a degradação do meio ambiente.

A lei que permite a terceirização do trabalho, em tramitação no Congresso Nacional, não pode, em hipótese alguma, restringir os direitos dos trabalhadores. É inadmissível que a preservação dos direitos sociais venha a ser sacrificada para justificar a superação da crise.

A corrupção, praga da sociedade e pecado grave que brada aos céus (cf. Papa Francisco – O Rosto da Misericórdia, n. 19), está presente tanto em órgãos públicos quanto em instituições da sociedade. Combatê-la, de modo eficaz, com a consequente punição de corrompidos e corruptores, é dever do Estado. É imperativo recuperar uma cultura que prima pelos valores da honestidade e da retidão. Só assim se restaurará a justiça e se plantará, novamente, no coração do povo, a esperança de novos tempos, calcados na ética.

A credibilidade política, perdida por causa da corrupção e da prática interesseira com que grande parte dos políticos exerce seu mandato, não pode ser recuperada ao preço da aprovação de leis que retiram direitos dos mais vulneráveis. Lamentamos que no Congresso se formem bancadas que reforcem o corporativismo para defender interesses de segmentos que se opõem aos direitos e conquistas sociais já adquiridos pelos mais pobres.

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000, por exemplo, é uma afronta à luta histórica dos povos indígenas que até hoje não receberam reparação das injustiças que sofreram desde a colonização do Brasil. Se o prazo estabelecido pela Constituição de 1988 tivesse sido cumprido pelo Governo Federal, todas as terras indígenas já teriam sido reconhecidas, demarcadas e homologadas. E, assim, não estaríamos assistindo aos constantes conflitos e mortes de indígenas.

A PEC 171/1993, que propõe a redução da maioridade penal para 16 anos, já aprovada pela Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça da Câmara, também é um equívoco que precisa ser desfeito. A redução da maioridade penal não é solução para a violência que grassa no Brasil e reforça a política de encarceramento num país que já tem a quarta população carcerária do mundo. Investir em educação de qualidade e em políticas públicas para a juventude e para a família é meio eficaz para preservar os adolescentes da delinquência e da violência.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, em vigor há 25 anos, responsabiliza o adolescente, a partir dos 12 anos, por qualquer ato contra a lei, aplicando-lhe as medidas socioeducativas. Não procede, portanto, a alegada impunidade para adolescentes infratores. Onde essas medidas são corretamente aplicadas, o índice de reincidência do adolescente infrator é muito baixo. Ao invés de aprovarem a redução da maioridade penal, os parlamentares deveriam criar mecanismos que responsabilizem os gestores por não aparelharem seu governo para a correta aplicação das medidas socioeducativas.

O Projeto de Lei 3722/2012, que altera o Estatuto do Desarmamento, é outra matéria que vai na contramão da segurança e do combate à violência. A arma dá a falsa sensação de segurança e de proteção. Não podemos cair na ilusão de que, facilitando o acesso da população à posse de armas, combateremos a violência. A indústria das armas está a serviço de um vigoroso poder econômico que não pode ser alimentado à custa da vida das pessoas. Dizer não a esse poder econômico é dever ético dos responsáveis pela preservação do Estatuto do Desarmamento.

Muitas destas e de outras matérias que incidem diretamente na vida do povo têm, entre seus caminhos de solução, uma Reforma Política que atinja as entranhas do sistema político brasileiro. Apartidária, a proposta da Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, da qual a CNBB é signatária, se coloca nessa direção.

Urge, além disso, resgatar a ética pública que diz respeito “à responsabilização do cidadão, dos grupos ou instituições da sociedade pelo bem comum” (CNBB – Doc. 50, n. 129). Para tanto, “como pastores, reafirmamos ‘Cristo, medida de nossa conduta moral’ e sentido pleno de nossa vida” (Doc. 50 da CNBB, Anexo – p. 30).

Que o povo brasileiro, neste Ano da Paz e sob a proteção de Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, supere esse momento difícil e persevere no caminho da justiça e da paz.

Aparecida, 21 de abril de 2015.

Cardeal Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida
Presidente da CNBB

Dom José Belisário da Silva, OFM
Arcebispo de São Luís do Maranhão
Vice Presidente da CNBB

Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo auxiliar de Brasília
Secretário-Geral da CNBB

(Foto em destaque: Coletiva de imprensa no início dos trabalhos da 53.ª Assembléia Geral da CNBB — da própria CNBB)

Câmara amplia ainda mais a terceirização

A Câmara dos Deputados aprovou ontem a noite a redação final do PL 4330/2004, que amplia a terceirização. O texto, que ainda precisa ser aprovado pelo Senado Federal e sancionado pela Presidência da República, prevê terceirização das atividades-fim da empresa contratante, contratação de empresários individuais como terceirizadores de mão-de-obra, fim da solidariedade entre contratante e contratada, apenas para citar algumas medidas.

A contratação de empresários individuais, acrescentada ao projeto de lei na votação de ontem à noite, pode permitir que uma pessoa seja contratada como se fosse uma empresa, acabando com os direitos trabalhistas dela. O fim da solidariedade entre contratante e contratada significa implica que, quando a contratada deixar de cumprir as obrigações trabalhistas, a contratante não poderá ser cobrada de imediato. Terceirizar a atividade-fim da empresa significa que não haverá mais limites para a contratação de terceirizados, mesmo que eles tenham relação de subordinação com a empresa — o que é formalmente vedado, mas como alguém poderia exercer a atividade própria da empresa sem que a mesma determine o que fazer e como fazer?

O governo federal orientou a bancada a votar contra a proposta.

  • Orientaram seus deputados a votar a favor da terceirização: PMDB, PSDB, DEM, Solidariedade, PPS, PP, PTB, PSC, PHS, PEN.
  • Orientaram seus deputados a votar contra a terceirização: PT, PSB (que não foi seguido por muitos de seus deputados), PDT, PCdoB, PROS, PV, PSOL, PRB, PTN, PMN, PRP, PSDC, PRTB, PTC, PSL, PTdoB.
  • Deixaram seus deputados votar como quisessem: PSD e PR.

O voto de cada deputado pode ser conferido no site da Câmara dos Deputados.

Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, onde a proposta será analisada agora, já se manifestou contrário a ela. “Essa regulamentação não pode significar só regulamentação da atividade-fim. Isso é uma inversão, é uma involução, significa revogar a Constituição, os direitos e as garantias individuais e coletivos”, disse. Segundo ele, a tramitação do projeto de lei no Senado Federal será normal, sem o açodamento visto na Câmara dos Deputados.

As entidades empresariais apoiaram o projeto. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) chegou a fazer propaganda em rede nacional de televisão para tentar convencer a população sobre os supostos benefícios da proposta, que teve forte oposição das centrais sindicais e dos estudantes, como demonstrado no dia último 15.

(Foto em destaque: deputados discutem terceirização — Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

Combate à corrupção: CGU economiza R$ 1,2 bilhão dos cofres públicos

A Controladoria-Geral da União (CGU) divulgou ontem (14) as cifras resultantes do trabalho de auditoria da folha de pagamento do poder executivo federal. Ao longo de cinco anos (2010 a 2014), foram economizados R$ 1,2 bilhão de reais que teriam sido pagos irregularmente a servidores públicos. O valor corresponde a mais de duzentas vezes o orçamento previsto para o órgão em 2015. A CGU verificou informações de 259 órgãos que utilizam o sistema eletrônico de gestão de pessoal civil do governo federal. Apenas 12 órgãos permanecem sem resolver mais de 5% das constatações do órgão de controle.

Denúncias contra a CGU

Ministro da CGU
Ministro da CGU, Valdir Moysés Simão, apresenta informações sobre a investigação da SBM Offshore. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Por outro lado, também ontem a Controladoria teve de se defender de acusações de Jonathan Taylor, ex-diretor da empresa holandesa SBM Offshore, fornecedora da Petrobras. A CGU começou a investigar o caso em abril de 2014 e, em outubro do mesmo ano, servidores do órgão foram à Inglaterra ouvi-lo pessoalmente a respeito de afirmações que ele fizera por e-mail. Na ocasião, ele indagou se poderia vir a ser recompensado financeiramente pela colaboração com a investigação, o que não está previsto na legislação brasileira. Notícia divulgada ontem pela Folha de S. Paulo afirmava de que o delator acusava a CGU de esperar a passagem das eleições presidenciais para só então investigar as denúncias de corrupção. O órgão, em resposta, publicou linha do tempo das investigações, evidenciando o contrário.

Cunha quer terceirização a todo custo

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), prometeu hoje (14) votar a qualquer custo o projeto de lei que retira os limites da terceirização. Segundo a Agência Brasil, ele afirmou que amanhã será este o único item da pauta do plenário da Câmara, e que será o único até ser votado, mesmo que demore várias e várias sessões, atrasando a apreciação de outros projetos. Por outro lado, as centrais sindicais e as organizações estudantis prometem manifestações e paralisações.

Tempos Modernos, filme de Charlie Chaplin, retrata a precariedade das condições de trabalho modernas.
Tempos Modernos, filme de Charlie Chaplin, retrata a precariedade das condições de trabalho modernas.

Segundo o DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), há uma relação “gritante” entre terceirização, trabalho escravo e acidentes de trabalho. Segundo informação publicada na Rede Brasil Atual, o exemplo é o setor elétrico, onde, de 75 mortes decorrentes de acidentes de trabalho em 2013, 61 foram de terceirizados (81%). Também o salário dos terceirizados é um quarto menor que o dos contratados diretamente.

O movimento estudantil se soma ao coro das centrais sindicais, “Estamos com as centrais sindicais porque somos os futuros trabalhadores do país e a terceirização é um grande problema. O terceirizado ganha menos que o efetivo. A terceirização vai diminuir direitos trabalhistas e precarizar as condições de trabalho. É uma medida para os empresários, que vão lucrar mais, não para o trabalhador”, afirmou à Rede Brasil Atual a presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Bárbara Bahia.

Também organizações católicas participarão da mobilização. Além de serem contrárias à ampliação da terceirização e à redução da maioridade penal, essas organizações trarão à pauta a reforma política e a implementação do Imposto sobre Grandes Fortunas, que já está previsto na Constituição Federal, mas nunca chegou a ser regulamentado.

Opinião de Visão Católica

Além da necessidade de proteção dos elementos mais frágeis da sociedade — no caso, os trabalhadores e os adolescentes —, algumas manifestações no último dia 12 deixaram clara a necessidade de se procurar outra pauta para a política brasileira, que não aquelas defendidas pelo presidente da Câmara e pelos movimentos políticos e partidários de direita.

Faixa contra padres marxistas
Faixa contra frei Gilvander
Faixa contra a CNBB
Faixas contra clérigos e a CNBB expõe o ódio de manifestantes à doutrina social da Igreja. Fotos: autor desconhecido. Fonte: Viomundo.

Além das velhas frases pela volta da ditadura militar (que perseguiu a Igreja Católica, de religiosos a bispos, como o servo de Deus dom Hélder Câmara), chamo a atenção para frases colocadas na casa dos bispos de Belo Horizonte. As faixas diziam: “Fora CNBB comunistas bolivarianos”, “‘Frei’ Gilvander você foi despejado da Igreja vá invadir terras em Cuba” e “Padres marxistas vcs. sao maus e perversos”. As frases foram escritas assim mesmo. Até mesmo uma agência de comunicação supostamente católica entrou na onda, e seu coordenador em língua portuguesa escreveu: “Fora Reforma política promovida pela CNBB”, misturando o protesto e o domingo da Divina Misericórdia. Mas, faltou misericórdia aos manifestantes desse domingo.

Sinagoga destruída por nazistas em Munique. A violência política foi a marca da ascensão dos nazistas ao poder. (Foto: autor desconhecido. Fonte: Wikimedia)
Sinagoga destruída por nazistas em Munique. A violência política foi a marca da ascensão dos nazistas ao poder. (Foto: autor desconhecido. Fonte: Wikimedia)

Atacar a CNBB (que propõe a reforma política como meio para se combater a corrupção) e padres ligados às camadas mais frágeis da população (caso do frei Gilvander Luís Moreira, ligado à Comissão Pastoral da Terra), junto com “ensaios sensuais” em plena manifestação, ou a defesa do assassinato político demonstram quem são e a quem se uniram os manifestantes contrários ao atual governo. Os bispos são ordenados para governar a Igreja (I Tm 3,5). Atacar os bispos brasileiros e se dizer católico é enganação. A banalização do sexo e a violência são diabólicas.

(Foto de destaque: Eduardo Cunha. Por Alex Ferreira/Câmara dos Deputados)

Maioridade penal: tramitação prossegue na Câmara

Cartaz
Cartaz da Pastoral da Juventude da CNBB contra a redução da maioridade penal.

Após aprovação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, os projetos de emenda à Constituição que tentam reduzir a maioridade penal tiveram andamento em sua tramitação. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-AL), constituiu nesse dia 7 a comissão especial que ira analisar o mérito das propostas e emitir um relatório para apreciação plenária em dois turnos.

Ontem, dia 8, iniciou o prazo para que os membros da comissão apresentem emendas ao projeto principal, ao qual estão apensados os demais. Esse é o momento em que os defensores das diferentes propostas de redução irão tentar fazer valer suas opiniões. Ao final da discussão na comissão especial, caso venha a ser aprovado, o projeto ainda será votado em dois turnos na Câmara dos Deputados e seguirá para o Senado Federal, que poderá acatar ou rejeitar a proposta, e também modificá-la (caso em que retornará à Câmara). Como se trata de emenda constitucional, a presidente da República não poderá vetar.

Na Comissão de Constituição e Justiça, apesar de os deputados terem muitas vezes se pronunciado sobre o mérito das propostas, a votação abrangeu apenas a admissibilidade na atual ordem constitucional.

A proposta vem tramitando rapidamente desde que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, foi indiciado na operação Lava Jato, o que o levou a propor uma “agenda positiva” para a casa legislativa, segundo os seus valores. A CNBB e a Pastoral da Juventude são contra o projeto, que visa punir em vez de educar uma camada muito frágil da população, principal vítima da violência, e que se encontra em uma fase de transição para a maturidade.

Câmara pode votar hoje a maioridade penal. Veja o posicionamento da Igreja.

Atualização: com a demora das discussões, a PEC 171/1993 não foi votada ontem (30), sendo previsto o início de sua votação às 10h de hoje (31/03/2015).


 

Devem ser votadas hoje (30), na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, as propostas de redução da maioridade penal. O voto do relator, deputado Luiz Couto (PT-PB), é contrário à redução.

Cartaz
Cartaz da Pastoral da Juventude da CNBB contra a redução da maioridade penal.

Em seu parecer, o deputado relembrou os argumentos apresentados durante a tramitação da matéria, iniciada em 1993. O jurista Miguel Reale Júnior, por exemplo, disse em 1999 que o sistema penitenciário nacional é brutalizador, desumano e incapaz de ressocializar as pessoas condenadas, e que a solução não estaria na mudança da legislação, e sim na correta aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Para o relator, “a opção da inimputabilidade penal ao menor de dezoito anos feita pelo legislador constituinte originário significa o comprometimento com a valorização da infância e da adolescência, por reconhecer que são fases especiais do desenvolvimento do ser humano, portanto, relacionada à dignidade da criança e do adolescente.”

Citando ainda a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, ele conclui: “a fixação da idade mínima de dezoito para a imputabilidade penal está intimamente ligada ao princípio da dignidade da pessoa humana, que é um dos fundamentos do Estado democrático de direito”, o que torna inconstitucional a redução da maioridade (trata-se, segundo o deputado, de cláusula pétrea, imutável, da Constituição Federal).

Por fim, ele ainda acrescentou que o que falta é o cumprimento efetivo do Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê algumas medidas sócio-educativas, como:

  • advertência;
  • obrigação de reparar o dano;
  • prestação de serviço à comunidade;
  • liberdade assistida;
  • inserção em regime de semiliberdade;
  • internação em estabelecimento educacional.

Para Luiz Couto, “o Estado aplicando efetivamente essas medidas sócio-educativas, qualquer menor que cometeu um delito e se internando em estabelecimento educacional, deverá ter plena recuperação para o convívio social e não cometerá tantos crimes.”

Votos em separado

Contudo, o voto em separado do deputado Onofre Agostini (PSD-SC), ele mesmo autor de proposta de redução da maioridade penal, alega que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania não poderia analisar se a proposta seria adequada, mas apenas se ela seria legal. Para defender a legalidade da proposta de redução da maioridade penal, ele ignora a discussão do relator acerca das convenções internacionais.

Já Efraim Filho (DEM-PB), também defensor da redução da maioridade penal, tentou descartar o argumento de que a Convenção Interamericana de Direitos Humanos seria um impedimento à redução, contudo, não argumento acerca da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, “que estabelece ser criança todo ser humano com menos de 18 anos de idade, com direito a uma proteção especial a seu desenvolvimento físico, mental, espiritual e social, através de uma forma de vida saudável e normal e em condições de liberdade e dignidade”, como diz o voto do relator Luiz Couto.

Opinião de Visão Católica

Como já noticiado antes em Visão Católica, a Pastoral da Juventude da CNBB é contrária à redução da maioridade. Em outra nota, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil afirmou:

Eles não são os principais responsáveis pelo aumento da violência que nos assusta a todos, especialmente pelos crimes de homicídio. De acordo com a ONG Conectas Direitos Humanos, a maioria dos adolescentes internados na Fundação Casa, em São Paulo, foi detida por roubo (44,1%) e tráfico de drogas (41,8%). Já o crime de latrocínio atinge 0,9% e o de homicídio, 0,6%. É, portanto, imoral querer induzir a sociedade a olhar para o adolescente como se fosse o principal responsável pela onda de violência no país.

E prosseguiu, taxativamente:

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ao contrário do que se propaga injustamente, é exigente com o adolescente em conflito com a lei e não compactua com a impunidade. Ele reconhece a responsabilização do adolescente autor de ato infracional, mas acredita na sua recuperação, por isso propõe a aplicação das medidas socioeducativas que valorizam a pessoa e lhe favoreçam condições de autossuperação para retornar a sua vida normal na sociedade.

Sobre as convenções internacionais, ela relembrou:

Adotada em 42 países de 54 pesquisados pela UNICEF, a maioridade penal aos 18 anos “decorre das recomendações internacionais que sugerem a existência de um sistema de justiça especializado para julgar, processar e responsabilizar autores de delitos abaixo dos 18 anos” (UNICEF). Reduzi-la seria “ignorar o contexto da cláusula pétrea constitucional – Constituição Federal, art. 228 –, além de confrontar a Convenção dos Direitos da Criança e do Adolescente, as regras Mínimas de Beijing, as Diretrizes para Prevenção da Delinquência Juvenil, as Regras Mínimas para Proteção dos Menores Privados de Liberdade (Regras de Riad), o Pacto de San José da Costa Rica e o Estatuto da Criança e do Adolescente” (cf. Declaração da CNBB contra a redução da maioridade penal – 24.04.2009).

E a CNBB concluiu pela proteção integral do adolescente e contra a redução da maioridade penal:

O Conselho Episcopal Pastoral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), reunido em Brasília, nos dias 14 a 16 de maio, reafirma que a redução da maioridade não é a solução para o fim da violência. Ela é a negação da Doutrina da Proteção Integral que fundamenta o tratamento jurídico dispensado às crianças e adolescentes pelo Direito Brasileiro. A Igreja no Brasil continua acreditando na capacidade de regeneração do adolescente quando favorecido em seus direitos básicos e pelas oportunidades de formação integral nos valores que dignificam o ser humano.

(Foto de destaque: Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania — Câmara dos Deputados)

Dom Raymundo Damasceno: sim à reforma política, não à ditadura e ao impeachment

O cardeal arcebispo de Aparecida (SP), Dom Raymundo Damasceno Assis, concedeu recente entrevista ao Diário de Pernambuco, na qual esclarece diversas questões, mas especialmente se posiciona em relação às questões políticas levantadas por diferentes setores da sociedade.

A entrevista, publicada dia 23, começa pela reafirmação, pelo cardeal, de que a comunhão para divorciados que contraiam uma segunda união continuará vetada, a menos que obtenham a declaração, em um tribunal eclesiástico, de que a primeira união era nula. “Teremos que ver caso a caso. Certamente, o sínodo [dos bispos sobre a família] não tomará nenhuma decisão de caráter genérico”, declarou.

Sobre a corrupção, o cardeal afirmou:

Corrupção sempre existiu em toda parte. E continuará existindo porque faz parte da pecaminosidade da humanidade, mas isso não justifica aceitá-la. Temos que combatê-la rigorosamente e com muita severidade através dos instrumentos que o estado dispõe: a polícia, o Judiciário, o próprio Congresso Nacional. Nos opomos à corrupção, pois é uma das formas de injustiça, sobretudo no campo social.

Sobre o momento atual, disse que “vivemos uma crise moral e ética, mas as crises não devem ser vistas como momento negativo. Podem ser o momento oportuno para a gestação de algo novo, de renovação, de purificação.” Um caminho de conversão, portanto. E aponta um instrumento fundamental para percorrer esse caminho:

A CNBB, conjuntamente com um grande número de entidades da sociedade civil organizada, elaborou uma proposta de reforma que pessoas estão confundindo como uma proposta do PT e de cunho bolivariano. Nada disso. É uma proposta com o apoio de vários partidos e com ela queremos provocar um debate na sociedade. Como vemos na Lava-Jato, é muito dinheiro que correu e corre nas campanhas eleitorais e que facilita a corrupção.

E ele também esclareceu que são quatro os pontos-chave dessa reforma:

  1. Financiamento público das campanhas (com o impedimento de empresas financiarem as campanhas eleitorais).
  2. Maior representação das mulheres, que são a maioria do eleitorado, mas com pouca representatividade nos cargos públicos.
  3. Regulamentação dos instrumentos constitucionais de democracia direta (plebiscito, referendo e projetos de lei de iniciativa popular).
  4. Votação em dois turnos para deputados e vereadores. “Primeiro, a votação no partido e no projeto. Depois, nos candidatos, apresentados em lista pelos partidos.”

Cabe lembrar que hoje o eleitor vota no candidato a vereador ou deputado, mas o voto é computado para o partido ou coligação.

Também a questão de que alguns grupos promovem um golpe militar foi abordada. Dom Raymundo foi taxativo: “É preferível a pior democracia à melhor das ditaduras. […] Não queremos ditadura nem golpe militar.” E prosseguiu:

Creio que isso não está em questão nem para os militares nem para a maioria da sociedade. Quem fez essa experiência não quer repetir. E para o impeachment não há motivo e fundamento, como afirmou o Supremo Tribunal Federal. Não há motivo para que seja iniciado um processo de impeachment. Por enquanto, a presidente está exercendo o mandato e parece não haver nenhum fato que a comprometa do ponto de vista ético e moral. Nesse momento é fundamental o diálogo.

Ao final, foi abordada a campanha da fraternidade 2015, que traz o lema “Eu vim para servir” (Mc 10,45). “A missão da Igreja é servir, a exemplo de Jesus Cristo”, disse ele. E prosseguiu: “E esse serviço deve ser prestado pelo leigo porque ele é a presença da Igreja no coração do mundo. Ele deve fazer da sua profissão, do seu trabalho um serviço aos outros. E mais ainda na política. O papa Paulo VI dizia que a política é uma das formas mais sublimes da caridade.”

(Clique aqui para ler a entrevista completa. Foto de destaque: Wilson Dias/ABr)

Executivo e judiciário assinam acordo para agilizar combate à corrupção

Representantes dos poderes executivo e judiciário, e também da OAB assinam acordo para agilizar processos sobre desvio de recursos públicos. Foto: CGU/PR.
Representantes dos poderes executivo e judiciário, e também da OAB assinam acordo para agilizar processos sobre desvio de recursos públicos. Foto: Dorivan Marinho/SCO/STF.

Representantes dos poderes executivo (os ministros da Justiça e da CGU, além do Ministério Público) e judiciário (Ricardo Lewandowski, presidente do STF e do CNJ), e também da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) assinaram hoje acordo para elaborar projeto de lei que venha a agilizar a tramitação de processos sobre lesão ao patrimônio público.

Embora ainda não haja envolvimento do poder legislativo, já está em vista um novo pacto republicano, envolvendo os três poderes para a tramitação mais ágil do projeto de lei. “Vamos fazer um grupo técnico para elaborar propostas e mandar para o Legislativo. Eventualmente, na hora que se tiver maior consenso, vamos chamar o Legislativo para fazer o terceiro pacto republicano. Já foram feitos dois pactos, que são projetos de lei acordados entre os Poderes para ter tramitação mais rápida. Quem dará a palavra final será, obviamente, o Legislativo”, disse o ministro da justiça, José Eduardo Cardozo.

Já o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, enfatizou que o desvio de recursos públicos tem como conseqüência a morte, pois impede o investimento em saúde e educação. “Mata o desenvolvimento da nossa sociedade”, afirmou. O grupo de trabalho formado pelos poderes públicos e pela OAB terá até 120 dias para apresentar suas propostas.

Na mesma cerimônia, o STF e os Estúdios Maurício de Sousa criaram parceria para a publicação de histórias em quadrinhos com os temas de combate à corrupção e defesa da ética. O Instituto Cultural Mauricio de Sousa já possui parceria semelhante com a Controladoria-Geral da União, órgão da Presidência da República responsável pelo combate e pela prevenção da corrupção no âmbito do poder executivo federal. Na tarde de hoje, o cartunista esteve também na sede da CGU para encontrar os servidores que levam à frente o projeto, denominado Um por Todos, Todos por Um! Pela ética e cidadania.

(Com informações da Agência Brasil e da Controladoria-Geral da União.)

CPI investigará contas na Suíça. Tucanos e empresários da mídia envolvidos

Instalada ontem, já começou a funcionar a CPI do HSBC, que investigará a suspeita de gigantesca evasão de divisas para contas bancárias na Suíça. Entre os nomes, pessoas que foram indiciadas no caso do Banestado (cujo melhor produto não foi o das investigações oficiais, mas o livro que analisou o resultado delas, A privataria tucana), e jornalistas e empresários da Mídia, incluindo Marinho (Globo), Frias (Folha de S. Paulo) e Saad (Bandeirantes). Os senadores do PSDB não assinaram o pedido de CPI. O PSDB também teria sido diretamente beneficiado por meio da conta Marília.

Na época do escândalo do Banestado, havia sido identificada uma conta denominada “Tucano”, que teria beneficiado diretamente o PSDB. “Políticos como José Serra (PSDB) e Jorge Bornhausen (DEM) constam de relatórios da Polícia Federal que mostram a existência de ordens de pagamento e registros de movimentações financeiras do esquema de lavagem de US$ 30 bilhões por meio da agência bancárias do Banestado de Foz do Iguaçu (PR)”, afirmou o portal Metrópole.

A CPI recém-instalada no Senado começará a fase de investigação pela oitiva de Fernando Rodrigues e Francisco Otávio, que participam da divulgação dos nomes dos beneficiários das contas secretas no HBSC suíço.

(Com informações da Agência Senado, Carta Maior, Congresso em Foco, IstoÉ, Luis Nassif e Portal Metrópole. Foto de destaque: sede do HSBC no Brasil, em Curitiba — Wikimedia.)

Entidades protestam contra financiamento empresarial de campanhas eleitorais

Protesto contra financiamento empresarial de campanhas eleitorais
Sacos representando doações de empresas a campanhas eleitorais foram colocados diante do Congresso Nacional. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.

As entidades que compõem a Coalizão pela reforma política democrática e eleições limpas espalharam duzentos sacos de “dinheiro” em frente ao Congresso Nacional como forma de protestar contra o financiamento de campanhas eleitorais por empresas.

“Empresa não é eleitor, ela não vota. Então, não tem porque ela participar das campanhas eleitorais, isso cria uma distorção no processo democrático e vai contra o conjunto da população”, disse Carlos Alves, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) à Agência Brasil. E acrescentou: “ela participa da eleição e depois vai cobrar a fatura por meio de contratos, isso deturpa o processo eleitoral e acaba promovendo a corrupção”. O MCCE foi um dos principais articuladores da campanha que culminou na aprovação da Lei da Ficha Limpa.

Além da proibição do financiamento de campanhas por empresas privadas, a coalizão também propõe a eleição proporcional (para vereadores e deputados) em dois turnos, paridade entre homens e mulheres nas candidaturas proporcionais, e fortalecimento dos mecanismos de democracia direta, com a participação da sociedade em decisões nacionais importantes.

As faixas utilizadas na manifestação também manifestavam repúdio a duas propostas de emendas à Constituição que têm em comum a intenção de restringir o acesso ao fundo partidário somente àqueles partidos que obtiverem votação superior a determinado limite.

Opinião de Visão Católica

Como tem sido insistentemente publicado aqui, o financiamento eleitoral por empresas tem sido um dos pontos-chave para a corrupção. No caso da Petrobras, embora nem todas as empresas citadas tenham realizado doações eleitorais, tem-se enfatizado que os recursos doados possam ser uma forma de propina.

Independente disso, porém, já há uma corrupção do sistema eleitoral pela própria existência dessas doações, que, como disse o representante do MCCE, são realizadas por quem não vota. Como poderiam, então, influenciar no processo eleitoral?

(Com informações da Agência Brasil)