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Resumo diário 10/03/2020

Segue o resumo das notícias mais interessante do dia:

Polícia tenta desocupar terreno que ameaça terra indígena em São Paulo

A construtora Tenda derrubou quatro mil árvores nativas e pretende erguer um grande conjunto habitacional a apenas oito metros de uma aldeia indígena mbya guarani em São Paulo – e tenta realizar o empreendimento ao arrepio da lei e dos tratados internacionais. A área é de manancial e tinha cobertura remanescente de mata atlântica, além de afetar diretamente os indígenas da terra vizinha – essa situação exigiria consulta prévia, livre e informada à comunidade indígena, mas isso não aconteceu. Em protesto, os índios ocuparam o terreno e esperaram a reintegração de posse, prevista para hoje. Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo atesta que os impactos “negativos, significativos, irreversíveis e de grande magnitude” sobre o ambiente urbano e a comunidade indígena “constituem impedimentos insuperáveis à implantação do projeto imobiliário” , além de agravar ainda mais os riscos de enchentes na cidade de São Paulo.

(Com informações do Conselho Indigenista Missionário.)

Nos EUA, Bolsonaro afirma que sua eleição foi fraudada

Esquivando-se mais uma vez da crise econômica, dos recordes seguidos de desvalorização do real e da perda de valor das ações de empresas brasileiras, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que as eleições de 2018 foram fraudadas. Ocorre que assim que ele mesmo foi eleito. O advogado de Lula concordou com o senhor que ocupa a presidência da República:

https://twitter.com/czmartins/status/1237212042337099776

Em 2018 obtivemos uma liminar no Comitê de Direitos Humanos da ONU sobre as eleições presidenciais no Brasil. Essas decisões eram vinculantes mas foram descumpridas pelo país. Faziam referência à ausência de “processo justo”. Premissa para qualquer discussão atual sobre o tema. (Cristiano Zanin)

Cabe lembrar que Luis Inácio Lula da Silva era o candidato favorito nas eleições de 2020, com pesquisas indicando que seria eleito já no primeiro turno.

Por fim, quando perguntado que provas teria de que a eleição foi fraudada, o senhor presidente desconversou.

(Foto em destaque: índios resistem em São Paulo. Fonte: Pagu Rodrigues.)

Resumo diário 20/02/2020

Segue o resumo das notícias mais interessantes do dia:

9 mortos em ataque terrorista de extrema direita na Alemanha

Em Hanau, na Alemanha, um extremista de direita matou 9 pessoas em bares frequentado por imigrantes. Segundo a Folha de São Paulo:

O suspeito, identificado como Tobias, era atirador esportivo e havia comprado armas de forma legal. Ele mantinha um site, no qual postou uma espécie de manifesto, que misturava ideias racistas e teorias da conspiração, segundo a procuradoria alemã.

Yacows trabalhou para muitas campanhas, diz sócio

Lindolfo Antônio Alves, sócio da Yacows, presta depoimento acompanhado de seu advogado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Em depoimento à CPMI das Fake News, Lindolfo Antônio Alves, sócio de empresa que realizou disparos massivos via WhatsApp na campanha eleitoral de 2018, afirmou que 37 campanhas utilizaram seus serviços – além de Jair Bolsonaro, os candidatos à presidência Fernando Haddad e Henrique Meirelles também aparecem na lista entregue à comissão parlamentar mista de inquérito.

Cid Gomes é baleado por policiais amotinados

Policiais amotinados em Sobral (CE) atiraram no senador Cid Gomes (PDT-CE) após este retirar com uma retroescavadeira o portão de um quartel da Polícia Militar do Ceará. A retroescavadeira já estava parada quando diversos disparos foram ouvidos, de mais de um lado, quebrando os vidros da cabine do trator e atingindo o senador da República. Ele já saiu da UTI e não corre risco de morte. Na opinião de Visão Católica, estavam todos errados: o senador, ao colocar em risco a integridade física de diversas pessoas com a retroescavadeira, e os atiradores, que agiram depois que já não poderia mais ser considerado legítima defesa, pois o equipamento já não estava mais ameaçando os amotinados. Convém lembrar que o motim por si só já é um crime.

Resumo diário 19/02/2020

Segue o resumo das notícias mais interessantes do dia:

Associação internacional pede fim de ataques a jornalista

A International Women’s Media Foundation pediu às autoridades brasileiras que “cessem os ataques [à jornalista Patrícia Campos Mello] imediatamente”. A jornalista foi alvo de um depoente à CPMI das Fake News, e esse ataque tem sido perpetuado pelos Bolsonaro e por apoiadores seus. O próprio presidente da República ofendeu a dignidade da jornalista em uma entrevista coletiva – o Visão Católica prefere não reproduzir a ofensa, já bastante difundida pelos meios de comunicação, entretanto, convém lembrar que se tratava de insinuação de prostituição, o que foi cabalmente desmentido por ela com provas.

CPMI das Fake News no rastro da campanha de Bolsonaro

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que apura a divulgação massiva de notícias falsas nas eleições de 2018 está no rastro da campanha de Jair Bolsonaro. Integrantes da comissão acreditam que a empresa Yacows foi utilizada por outra, a AM4, contratada pela campanha do atual presidente para espalhar essas notícias. Várias ilegalidades podem ter sido cometidas para isso, incluindo registrar falsamente chips de celular em nome de idosos sem relação com a empresa, além da própria divulgação de notícias falsas em massa pela campanha eleitoral.

Cortes no Bolsa Família fazem cair a renda dos mais pobres

De 2014 a 2018, a renda dos 5% mais pobres do Brasil caiu 39%, e a população miserável aumentou 67%. Essa piora nas condições de vida coincide com desajustes e redução do Programa Bolsa Família (PBF), que voltou a ter fila de espera. No ano passado, 900 mil famílias foram descadastradas, e a fila média anual passou a ser de 500 mil famílias, já chegando a 3,5 milhões de pessoas. Parte da redução do programa se deveu ao fim de flexibilizações dos critérios de permanência desde o governo Temer. O orçamento do PBF para este ano é menor que o do ano passado.

Enviado das Nações Unidas à Síria pede solução política

O enviado especial da ONU para a Síria, Geir O. Pederson, instou as nações a procurarem uma solução política para a guerra civil, em vez de insistirem na via bélica. A atual ofensiva do governo contra os terroristas islamitas já resultou em cerca de 900 mil pessoas deslocadas. A Turquia, por sua vez, insistiu em ameaçar o governo de seu vizinho árabe e não aceita qualquer coisa, senão a devolução do território que os jihadistas perderam desde dezembro. Enquanto isso, o Comitê Constitucional criado ano passado para traçar as diretrizes de uma nova Constituição para a Síria, permanece paralizado.

(Foto em destaque: reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a situação no Oriente Médio em 19/02/2020. Fonte: Nações Unidas.)

Exército mantém o rumo do golpe

Nota divulgada pelo Centro de Comunicação Social do Exército, a pretexto de reafirmar o compromisso da instituição com a democracia, não corrigiu o rumo tomado desde o pronunciamento do general Mourão, endossado pelo comandante Villas Boas. O compromisso com a democracia e a fidelidade à hierarquia, reafirmados pelo Exército Brasileiro, são os mesmos afirmados antes, nos anos 1950 e 1960, e que resultaram nos golpes de 1954, 1955 e 1964, além das sublevações de 1956 e 1959.  Eis a íntegra da nota:

Nota de Esclarecimento

Com relação ao episódio veiculado em mídia que envolveu o General de Exército Antônio Hamilton Martins Mourão, o Comandante do Exército, General de Exército Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, informa:

1. O Exército Brasileiro é uma instituição comprometida com a consolidação da democracia em nosso País.

2. O Comandante do Exército é a autoridade responsável por expressar o posicionamento institucional da Força e tem se manifestado publicamente sobre os temas que considera relevantes.

3. Em reunião ocorrida no dia de ontem, o Comandante do Exército apresentou ao Sr. Ministro da Defesa, Raul Jungmann, as circunstâncias do fato e as providências adotadas em relação ao episódio envolvendo o General Mourão, para assegurar a coesão, a hierarquia e a disciplina.

4. O Comandante do Exército reafirma o compromisso da Instituição de servir à Nação Brasileira, com os olhos voltados para o futuro.

Atenciosamente,

CENTRO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DO EXÉRCITO
EXÉRCITO BRASILEIRO
BRAÇO FORTE – MÃO AMIGA

No entanto, veja-se o que diziam os coronéis em 1954:

Oficiais superiores que se julgam credenciados por todo o seu passado militar, sentem-se no iniludível dever moral, por lealdada aos Chefes e consciência de suas próprias responsabilidades perante os subordinados, de submeter à consideração do Alto Comando a presente exposição dos graves problemas com que se defronta o Exército, nesta hora de sérias apreensões.

[…]

É bem verdade que, dentre esses problemas todos — sob o ponto de vista da segurança nacional — um dos mais sérios é o do aparelhamento real do Exército para o cumprimento, a qualquer instante, das indeclináveis missões que lhe cabem. Generaliza-se — triste é confessá-lo — o sentimento de que temos mesmo involuído quanto à preparação dos quadros e da tropa, assistência aos conscritos, manutenção e renovação do equipamento militar. […]

O clima de negociata, desfalques e malversação de verbas que infelizmente vem, nos últimos tempos, envolvendo o país e até mesmo o Exército, está, por outro lado, a exigir se oponham sólidas barreiras que lhe detenham o transbordamento dentro das classes armadas, cujo padrão de honestidade e decoro administrativo, acima das mais leves suspeitas ou de críticas, só se poderá manter se além de rigorosas normas de administração e controle, vigorar alerta um espírito coletivo de decidida contenção e repulsa contra quaisquer desmandos ou falências morais, sobretudo na gestão dos dinheiros públicos.

[…]

E a elevação do salário mínimo a nível que, nos grandes centros do país, quase atingirá o dos vencimentos máximos de um graduado, resultará, por certo, se não corrigida de alguma forma, em aberrante subversão de todos os valores profissionais, estacando qualquer possibilidade de recrutamento, para o Exército, de seus quadros inferiores.

[…]

Em conseqüência desse manifesto, de coronéis que juravam lealdade ao Alto Comando (assim como o general Mourão, que dele faz parte), foi exonerado o então ministro do trabalho, João Goulart, que elevara o salário mínimo em 100% — os militares graduados achavam que um salário mínimo menos indecente dificultaria o recrutamento de praças. A percepção da corrupção, como hoje, era usada como desculpa para golpismos. No mesmo ano, a “República do Galeão”, que investigava à margem da lei o atentado da rua Toneleros, levou ao suicídio de Getúlio Vargas. Não à toa, dizem que hoje existe uma “República de Curitiba”.

Em 1955, o coronel Jurandir de Bizarria Mamede, no velório do general Canrobert Pereira da Costa, a despeito de haver no local oficiais mais antigos que ele, inclusive o presidente do Clube Militar, general Pedro Leonardo de Campos, fez um discurso de homenagem ao camarada falecido, na verdade o início de uma tentativa de impedir Juscelino Kubitschek de assumir a presidência da República. Chamo a atenção para um trecho do discurso:

Compenetrado das pesadas responsabilidades que cabem aos altos chefes militares, sobretudo em país como o nosso, em  marcar, a duras penas, para a concretização de seu ideal democrático e onde por isso mesmo a violência por parte daqueles chefes será indispensável, muitas vezes para prevenir dias amargos para o povo e evitar a desordem pública e para a derrocada nacional — soubeste manter sempre, com serenidade e decisão, a posição do mais justo equilíbrio entre um partidarismo — inadmissível para teus foros de soldado — e a passividade e a omissão — de qualquer forma incompatível com teu elevado conceito do que seja a verdadeira liderança militar.

Para derrotar o golpe escancarado pelo coronel Mamede, o general Lott, então ministro da guerra, procurou todos que poderiam punir o coronel, sem sucesso. Teve de ele mesmo tomar providências e destituir o presidente Café Filho para garantir a posse de Juscelino Kubitschek, que havia sido eleito pelo povo.

Os trechos que destaquei descrevem por si mesmos as semelhanças com os dias de hoje. A ênfase à questão do salário mínimo é porque, hoje como então, o que os militares realmente temem é a volta ao poder daqueles que deram melhores condições de vida aos trabalhadores. Em 1955, isso era simbolizado por Juscelino Kubitschek; hoje, é simbolizado por Lula. Para quem conhece a história, o recado é claro: se Lula não for impedido de se candidatar, não pode ser eleito; se for eleito, os militares não deixarão tomar posse; se tomar posse, não deixarão governar. Esse recado é uma paráfrase de Carlos Lacerda, personagem central da política brasileira entre 1945 e 1964. Não é à toa que o general Villas Boas mencionou as eleições do próximo ano.

Citações:

MORAIS, Antonio Henrique de Almeida et aliMemorial dos Coronéis. In: CARONE, Edgard. A Quarta República (1945-1964). São Paulo: Difel, 1980, p. 556-564.

MAMEDE, Jurandir de Bizarria. Discurso junto ao túmulo do general Canrobert Pereira da Costa. In: ARGOLO, José A. et ali. A direita explosiva no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad, 1996, p. 56-58.

(Foto em destaque: general Eduardo Villa Boas, pelo Comando do Exército)