Argentina: com repressão, Senado aprova Lei de Bases

Enquanto manifestantes eram reprimidos do lado de fora, o Senado argentino aprovou a Lei de Bases por uma estreita margem: 37 a 36, com voto de desempate da vice-presidente da República. Embora tenha sido reduzido ao longo das negociações, o pacote de medidas ainda prevê prejuízos a trabalhadores e benefícios somente para grandes empresários, incluindo a privatização de empresas como a Aguas y Saneamento Argentinos S.A. O projeto de lei também permitirá ao presidente Javier Milei legislar sem o Congresso em questões de administração, economia, finanças e energia.

Entre as vítimas da repressão estavam até mesmo deputados do partido União Pela Pátria (UPP). Pablo Moyano, sindicalista da Confederação Geral do Trabalho (CGT), denunciou que o governo de Milei teria pressionado os governadores das províncias por meio da concessão de obras públicas para obter o voto favorável dos senadores. A pressão popular, embora insuficiente para barrar a medida, conseguiu retirar da proposta a privatização de empresas como a Aerolíneas Argentinas, os Correios e a Rede de Televisão Argentina (RTA) – reduzindo de 40 para oito as empresas que se tentará vender. O governador da província de Buenos Aires, contudo, afirmou que “não há um só artigo no projeto que está sendo debatido no Congresso que beneficie o nosso povo, a produção ou a indústria”.

Entre as medidas que beneficiam grandes empresas está um regime de benefícios fiscais para empresas que invistam ao menos US$ 200 milhões em áreas como petróleo, gás e mineração – gasto público que acontece em detrimento dos setores mais vulneráveis da sociedade, vítimas do arrocho. Também as obras públicas serão totalmente paralisadas enquanto se beneficiam algumas poucas corporações privadas. Segundo opositores, haverá a retirada da autonomia provincial em questões climáticas, o que em certa medida ferirá a legislação ambiental.

(Imagem em destaque: perfil no X de Axel Kicillof)

Paraná: apesar de protestos, governo decide privatizar escolas

Apesar dos protestos de professores, técnicos em educação e estudantes, a Assembleia Legislativa do Paraná aprovou ontem a proposta do governo de Ratinho Jr. de não enfrentar os problemas estruturais da educação pública no estado, como a falta de professores efetivos, por exemplo, e decidiu que escolas públicas podem ter sua gestão cedida à iniciativa privada. O governador sancionou a lei hoje mesmo.

Manifestante segura cartaz em que se lê: "Lugar de rato é no bueiro!"
Manifestante segura cartaz contra o governador Ratinho Jr (foto: ALEP – domínio público).

A nova regra prevê que os professores das duzentas escolas terceirizadas jamais terão contrato permanente para trabalhar, mas serão sempre trabalhadores precários – o que o governo apresenta como uma vantagem: “professores temporários (PSS) terão condições de trabalho melhoradas, com a possibilidade de contratos em regime CLT”. Dessa forma, em vez de ter profissionais concursados contratados em caráter permanente – e, portanto, incentivados a se capacitar em sua área de atuação –, o governo garante para os estudantes paranaenses que eles nunca terão em sala um profissional que possa se concentrar em cuidar do processo de ensino e aprendizagem, mas sempre alguém pensando no que terá de fazer da vida ao final do contrato (teoricamente, mesmo a gestão escolar privada será precária, segundo o próprio governo).

A nova lei também garante que a mesma verba já disponível para manter e aprimorar as instalações escolares, comprar insumos e equipamentos para a educação terá que ser dividida com o lucro das empresas gestoras e com a remuneração de seus diretores, que é sempre várias vezes maior que a dos profissionais de base – no serviço público, diretores recebem apenas uma gratificação adicional, jamais capaz de multiplicar os vencimentos.

O site da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (ALEP) resume os discursos dos deputados oposicionistas:

Os deputados se alternaram na defesa e na contestação da proposta legislativa. Pela Oposição, a deputada Luciana Rafagnin (PT) expôs seu temor pelo fim dos concursos públicos diante da possibilidade de novos formatos de contratação de professores. O deputado Professor Lemos (PT), docente há 41 anos, definiu como o pior projeto visto na carreira para a educação do Estado. O deputado Arilson Chiorato (PT) alegou inconstitucionalidade do texto e que a Oposição irá recorrer judicialmente da matéria. O deputado Goura (PDT) criticou a tramitação no “atropelo” do regime de urgência. Já o deputado Renato Freitas (PT) definiu a educação como um escudo, especialmente da população mais pobre e negra.

De maneira muito acertada, mas bastante dúbia, o deputado situacionista Tito Barichello afirmou: “o governador Ratinho Junior está mudando a história do Paraná”.

A nova “gestão democrática” começou com a prisão de dois manifestantes, o pedido de prisão da presidente do sindicato dos professores (APP-Sindicato) e a realização de três votações em apenas dois dias.

DataSUS: diretor leva dados da saúde para a Amazon e vai junto com eles

Em abril de 2020, o Ministério da Saúde e a Embratel firmaram um acordo para levar os dados do Sistema Único de Saúde (SUS) para servidores de Internet da Amazon, empresa do oligarca norte-americano Jeff Bezos. Assim, informações de saúde de quase todos os brasileiros passaram para o controle de uma das maiores empresas dos EUA, contratada do Departamento de Defesa desse país, e que tem entre seus serviços o que diz ser “o mais amplo e profundo serviço de aprendizado de máquina e inteligência artificial”. Ocorre que o diretor responsável pela contratação, Jacson Barros, saiu do DataSUS direto para a Amazon, um caso de conflito de interesses que gera dúvidas sobre a lisura da escolha da corporação estadunidense – a informação é do jornal Brasil de Fato.

Embora a Amazon seja contratada por diversas empresas privadas para manter seus dados e hospedar seus sistemas eletrônicos, o governo federal tem duas grandes empresas na área: o Serpro e a Dataprev. Apesar de serem empresas estratégicas e lidarem com dados sensíveis do governo e da população, ambas vêm sofrendo com orçamento insuficiente e têm sido ignoradas em contratações públicas, além de terem sido expostas na vitrine do governo para vender tudo o que resta dos sistemas eletrônicos e dados públicos brasileiros: em 2019 foram incluídas na lista de empresas públicas a serem privatizadas.

(Foto em destaque: ex-diretor do DataSUS, Jacson Barros – Ministério da Saúde)