No princípio era o Verbo…

Há grupos que não acreditam que Jesus Cristo, Verbo de Deus encarnado, seja Deus. No entanto, vejamos:

No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus, e o Verbo era Deus. (Jo 1,1)

Ἐν ἀρχῇ ἦν ὁ λόγος, καὶ ὁ λόγος ἦν πρὸς τὸν θεόν, καὶ θεὸς ἦν ὁ λόγος. (κατα Ιωαννην 1,1)

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No princípio: na origem. Sem complemento, significa “na origem de tudo”. Aliás, palavra grega (ἀρχή, arqué) muito semelhante à portuguesa. Em hebraico, רֵאשִׁית (bereshit), como em Gênesis 1,1: “No princípio, Deus criou o céu e a terra” – aliás, foi justamente a palavra arqué que os sábios judeus utilizaram para traduzir Gn 1,1 para o grego (Ἐν ἀρχῇ ἐποίησεν ὁ θεὸς…). Portanto, trata-se daquele princípio anterior à criação do céu e da terra, ou seja, antes de toda criação. Naquele princípio, “era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e Deus era o Verbo”.

Há grupos que negam a divindade de Jesus Cristo. Deus, o todo-poderoso, não teria o poder de tomar para si a natureza humana. Se Jesus não fosse Deus, onde estaria no princípio, quando ainda não existiam céu e terra? O Verbo não passou a existir com a criação, mas já existia, e estava com Deus, e era Deus.

Com efeito, Deus Pai “nos escolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, diante de seus olhos” (Ef 1,4). “Ele existe antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem nele” (Cl 1,17), “nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as criaturas visíveis e as invisíveis. Tronos, dominações, principados, potestades: tudo foi criado por ele e para ele” (Cl 1,16). “Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi feito” (Jo 1,3). “Antes da criação do mundo” (πρὸ καταβολῆς κόσμου), “existe antes de todas as coisas” (αὐτός ἐστιν πρὸ πάντων), “todas as coisas subsistem nele” (τὰ πάντα ἐν αὐτῷ συνέστηκεν), “nele foram criadas todas as coisas” (ἐν αὐτῷ ἐκτίσθη τὰ πάντα), “tudo foi criado por ele e para ele” (τὰ πάντα δι’ αὐτοῦ καὶ εἰς αὐτὸν ἔκτισται), “tudo foi feito por ele” (πάντα δι’ αὐτοῦ ἐγένετο), “sem ele nada foi feito” (χωρὶς αὐτοῦ ἐγένετο οὐδὲ ἕν). Com efeito, Jesus Cristo é o “faça-se” (Gn 1) de Deus na criação do mundo (cf. Sb 9,1; Sl 33[32],6), é a enunciação do conhecimento de Deus Pai (Jo 1,1-18; Sb 7,25-27), por meio do qual ele cria tudo e faz tudo (v. Jo 1,3; Jo 5,19-30). Só Deus existe por si mesmo, e Jesus Cristo existe por si mesmo (cf. Jo 5,26). Ele existe antes de tudo, e só Deus existe antes de tudo.

Imitando Cristo (6)

Livro I – Avisos úteis para a vida espiritual

Capítulo 6 – Das afeições desordenadas

1. Todas as vezes que o homem deseja alguma coisa desordenadamente, torna-se logo inquieto. O soberbo e o avarento nunca sossegam; entretanto, o pobre e o humilde de espírito vivem em muita paz. O homem que não é perfeitamente mortificado facilmente é tentado e vencido, até em coisas pequenas e insignificantes. O homem espiritual, ainda um tanto carnal e propenso à sensualidade, só a muito custo poderá desprender-se de todos os desejos terrenos. Daí a sua freqüente tristeza, quando deles se abstém, e fácil irritação, quando alguém o contraria.

2. Se, porém, alcança o que desejava, sente logo o remorso da consciência, porque obedeceu à sua paixão, que nada vale para alcançar a paz que almejava. Em resistir, pois, às paixões, se acha a verdadeira paz do coração, e não em segui-las. Não há, portanto, paz no coração do homem carnal, nem no do homem entregue às coisas exteriores, mas somente no daquele que é fervoroso e espiritual.

Quantas vezes procuramos a paz e não achamos! Procuramos a paz cuidando de nossa saúde, procurando um bom emprego, divertindo-nos com os amigos… Isso tudo é bom, mas não garante paz. Outras vezes, procura-se paz escapando da vida real, entregando-se à busca desenfreada de prazer no sexo “livre”, nas drogas, na acumulação de bens materiais, na compra do que há de mais novo, ou do que está na moda. Isso muito menos garante a paz.

A saúde um dia se abala, o emprego se perde ou estressa, os amigos vão e vem… O sexo passa a ser uma necessidade sempre urgente, aprisionando e esvaziando, em vez de complementando, as drogas viciam e debilitam, os bens materiais nunca são suficientes, sempre surge algo mais novo ou a moda muda… Procuramos em nossa própria razão ou em nossas próprias afeições aquilo que nos satisfaria eternamente, mas não podemos encontrar satisfação permanente no que é passageiro e limitado.

“Bem-aventurado aquele que tem coração de pobre”! (Mt 5,3) Aquele que não se apega às coisas criadas, mas ao criador que as fez, o Pleno, o Eterno, de quem se origina toda existência e todo bem, é ele quem pode saciar a nossa sede, preencher a nossa falta. “Em verdade vos declaro: todo aquele que deixar irmãos, irmãs, pai, mãe, mulher, filhos, terras ou casa receberá o cêntuplo e possuirá a vida eterna.” (Mt 19,28a.29)

As coisas criadas jamais saciam nossa sede. Quando bebemos, logo precisamos beber mais. Quando comemos, logo precisamos comer mais. Quando possuímos, logo precisamos possuir mais. A água que bebemos se transforma em suor e urina. O alimento que comemos se transforma na energia que alimenta nosso corpo, ou é eliminado nas fezes. O que possuímos se desgasta e se perde. Onde, então, poderemos saciar nossa sede de sermos plenos e verdadeiramente vivos?

“Respondeu-lhe Jesus: ‘Todo aquele que beber desta água tornará a ter sede, mas o que beber da água que eu lhe der jamais terá sede. Mas a água que eu lhe der virá a ser nele fonte de água, que jorrará até a vida eterna’.” (Jo 4,13s) É Deus quem pode nos saciar na “esperança da vida do mundo que há de vir” (Símbolo Niceno-Constantinopolitano). Devemos, então, deixar para trás os nossos bens e depois seguir Jesus (Mt 19,21), o único caminho que leva ao Pai (Jo 14,6). Não demos, então, mais importância às criaturas que ao criador. Se queremos receber o bem até à plenitude, devemos nos entregar a Deus. “Só Deus é bom. Se queres entrar na vida, observa os mandamentos” (Mt 19,17bc).

Uma lei que legalizaria o aborto?

No dia primeiro deste mês foi promulgada a lei n.º 12.845/2013, que trata do “atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual”. Vejamos seu texto:

Art. 1o Os hospitais devem oferecer às vítimas de violência sexual atendimento emergencial, integral e multidisciplinar, visando ao controle e ao tratamento dos agravos físicos e psíquicos decorrentes de violência sexual, e encaminhamento, se for o caso, aos serviços de assistência social.

Art. 2o Considera-se violência sexual, para os efeitos desta Lei, qualquer forma de atividade sexual não consentida.

Art. 3o O atendimento imediato, obrigatório em todos os hospitais integrantes da rede do SUS, compreende os seguintes serviços:
[…]
IV – profilaxia da gravidez;

O atendimento integral à vítima de violência sexual (mesmo que não seja crime de estupro) é evidentemente necessário e bom. Contudo, o que deve ser realmente entendido como “atendimento integral”? Nem tudo o que está na lei.

O aborto continua sendo crime, ainda que, de maneira igualmente criminosa, o STF tenha estendido a ausência de punição a casos que a lei não prevê. Se considerarmos apenas o código penal, nenhum médico poderia realizar aborto no Brasil, pois todo aborto provocado é crime, mesmo que não possa haver punição nos casos previstos. Para evitar problemas com o código penal, a lei n.º 12.845/2013 traz o termo “profilaxia da gravidez”. Mas, o que é isso, afinal?

“Profilaxia”, a princípio, é a prevenção de doenças ou a preservação da saúde. Trata-se, portanto, de transformar em “doença” uma situação muito especial e que exige cuidados, mas que não é um funcionamento anormal do organismo – ao contrário, é esperado que a mulher saudável possa engravidar mediante relação sexual. Há, como se vê, uma inversão de valores, que transforma o positivo em negativo.

Além disso, o que poderia ser feito para a “profilaxia” da gravidez? Se a mulher já ovulou e o óvulo já perdeu seu poder de gerar uma nova vida mediante a fecundação por um espermatozóide, não há o que ser feito, pois não ocorrerá gestação. Se a mulher ainda não ovulou, pode-se induzir quimicamente a infertilidade. Se, porém, a mulher está fértil durante a violência sexual e a ovulação ocorreu antes da chegada ao serviço de saúde, não há o que se possa fazer.

Alguém poderia argumentar: mas e a pílula do dia seguinte? Efetivamente, ela pode retardar ou impedir a ovulação, além de alterar o muco cervical – até aí, semelhante a qualquer esterilização química.

Foto de embrião
Embrião humano com 9 semanas de gestação

Porém, ela também impede que a blástula penetre o endométrio (camada do útero que o bebê recém-gerado penetra) e ali se fixe, o que levaria, sendo um ser humano saudável, ao prosseguimento do desenvolvimento com a transformação em embrião, depois feto, bebê, criança, adolescente, adulto e idoso.
Quer dizer, a pílula do dia seguinte, utilizada quando o óvulo pode ter sido fecundado, é um método abortivo, uma forma de matar um ser humano desprotegido.

Infelizmente, a sociedade, vitimada por uma propaganda enganosa, não tem compreendido isto. Tratam o ser humano como um objeto descartável apenas porque não nasceu. Mas, se fosse assim, por que o aborto natural ou o óbito fetal causariam tanta dor em quem os sofre? O natimorto “morreu”, “foi a óbito”, recebe uma certidão no cartório, inscrita no livro auxiliar de óbitos, e seu “decesso” deve ser sepultado. Isso tudo se fala ou se faz com seres humanos, não com coisas outras. Matar um zigoto, uma mórula, um embrião porque o sexo não foi consentido é matar um ser humano pleno, que se desenvolverá em feto e depois em nenê, como uma criança se desenvolve em adulto, e um adulto se desenvolve em velho.

A lei efetivamente traz esse ponto profundamente negativo: trata a gestação de um novo ser humano como doença e, porque a sociedade aceita a pílula do dia seguinte como um método supostamente não-abortivo (enganada que está pela propaganda), mesmo matando o embrião por impedir sua fixação no útero, a lei assim permite o aborto.

Imitando Cristo (5)

Livro I – Avisos úteis para a vida espiritual

Capítulo 5 – Da leitura das Sagradas Escrituras

1. Nas Sagradas Escrituras devemos buscar a verdade, não a eloqüência. Todo livro sagrado deve ser lido com o mesmo espírito que o ditou. Nas escrituras devemos antes buscar nosso proveito que a sutileza de linguagem. Tão grata nos deve ser a leitura dos livros simples e piedosos, como a dos sublimes e profundos. Não te mova a autoridade do escritor, se é ou não de grandes conhecimentos literários; ao contrário, lê com puro amor à verdade. Não procures saber quem o disse, mas considera o que se diz.

2. Os homens passam, mas a verdade do Senhor permanece eternamente (Sl 116[117],2). De vários modos nos fala Deus, sem acepção de pessoas. A nossa curiosidade nos embaraça, muitas vezes, na leitura das Escrituras; porque queremos compreender e discutir o que se devia passar singelamente. Se queres tirar proveito, lê com humildade, simplicidade e fé, sem cuidar jamais do renome de letrado. Pergunta de boa vontade e ouve calado as palavras dos santos; nem te desagradem as sentenças dos velhos, porque eles não falam sem razão.

Quantos teólogos caíram nessa armadilha! Quantos julgaram conhecer a verdade e semearam o erro! Isso vem já dos primeiros tempos da Igreja, quando os apóstolos tinham de exortar as comunidades a ouvir aqueles que Deus constituíra transmissores da palavra e não dar ouvido a falsos evangelhos (v.g. Gl 1,1-8). Se confiamos apenas na nossa própria razão, não somos capazes de compreender o anúncio de Deus, porque Deus é infinitamente maior que a nossa razão.

Quantas vezes Deus nos falou pelos iletrados (v. Mt 11,25; I Cor 1,26-28)! pois a Sabedoria de Deus é loucura para os homens (I Cor 1,18ss). No entanto, se queremos que nossa razão alcance Deus – o que é louvável -, então devemos nos deixar guiar pela fé. A teologia, na verdade, não é mais que a fé a procurar a compreensão do mistério divino – o mistério do Filho do Deus vivo (Mt 16,16), que se fez homem para que conheçamos o Pai e tenhamos a vida eterna (Jo 17,23).

A teologia é o intelecto que se deixa guiar pelo Espírito de Deus, para que o próprio Deus indique, pela fé, o caminho da verdadeira ciência. Para isso, no entanto, é necessária a humildade daquele que se deixa guiar, mesmo sabendo ver – porque ver não é apenas questão de ter olhos saudáveis. Vê bem aquele que compreende que, por trás das coisas que percebemos com os sentidos, há um sentido que se revela em Cristo – ele que é o Caminho, a Verdade e a Vida (Jo 14,6), pois é o único caminho que leva a conhecer o Pai (Mt 11,27), e conhecer Deus é a vida eterna (Jo 17,23).

Igreja peregrina

Faz tempo que não escrevo aqui, e não há tempo melhor para voltar – em plena Jornada Mundial da Juventude, da qual não posso participar pessoalmente, mas que tento acompanhar pela Rede Vida. Muito se fala sobre peregrinos nestes dias, incluindo o próprio papa Francisco, que se fez peregrino ao Rio de Janeiro e a Aparecida. Hoje (ainda) é dia de São Tiago, apóstolo, irmão de João. Nascido em Betsaida, foi o primeiro a governar a Igreja em Jerusalém e também o primeiro apóstolo a testemunhar a fé com a morte a mando de Herodes Agripa.

As laudes de hoje traziam a leitura da carta aos Efésios:

Já não sois mais estrangeiros nem migrantes, mas concidadãos dos santos. Sois da família de Deus. Vós fostes integrados no edifício que tem como fundamento os apóstolos e os profetas, e o próprio Jesus Cristo como pedra principal. É nele que toda a construção se ajusta e se eleva para formar um templo santo no Senhor. E vós também sois integrados nesta construção, para vos tornardes morada de Deus pelo Espírito. (Ef 2,19-22)

O que esse texto diz é simples: onde quer que estejamos, estamos em nossa terra, pois não somos mais do mundo (Jo 17,16), e sim “concidadãos dos santos”, isto é, cidadãos do Reino de Deus. Vivemos desde já essa realidade (Jo 17,13.20-24), de forma que contamos com o auxílio de nossos irmãos que já não estão nesse mundo, ao qual também nós não pertencemos, o qual deixaremos um dia para nos juntar plenamente à felicidade celeste.

Já não há migrante, já não há estrangeiro, já não há quem seja natural deste mundo, pois nossa natureza, renovada pelo Batismo (2Cor 5,17), é agora de partícipes da natureza divina (2Pd 1,4; v. Rm 6,2-14). A Igreja toda é peregrina e, onde quer que esteja – onde quer que esteja cada um de seus membros -, estará sempre no Reino de Deus, e jamais pertencerá a este mundo dominado pelas trevas (Ef 6,12). Somos do céu, ainda que estejamos hoje no mundo. Não nos contentamos com este mundo, mas somos testemunhas da realidade futura, que já vivemos com nossa cidadania celeste.

O papa Francisco I

Papa Francisco IA essa hora, muitas palavras já foram ditas sobre o novo papa, Francisco I. Alguns o elogiaram, outros já o criticaram. Muito também já falaram sobre o que ele representa para a Igreja, conforme a vontade de cada um que comenta. Peço licença para fazer uma breve observação dos fatos desde o último pontificado.

O papa emérito, Bento XVI, desde o princípio tentou abrir a Igreja para o mundo, no sentido de não esconder as dificuldades que ela vive, a cada dia, desde quando foi fundada por Jesus Cristo. Liberou o acesso aos documentos do arquivo vaticano até o pontificado de Pio XI, submeteu-se a entrevista televisiva, submeteu-se também à entrevista que se tornou o livro Luz do Mundo, onde tratou dos temas mais polêmicos, endureceu o tratamento dado aos que abusam de menores. Tudo isso provou uma grande humildade, transmitida a toda a Igreja, ainda que nem todos os membros do corpo de Cristo o tenham seguido no mesmo ritmo.

Porém, a maior renovação, o maior gesto de humildade de Bento XVI, foi sua renúncia. Não se apegou a um cargo proeminente, a ser o vigário de Cristo, mas demonstrou ser verdadeiramente o servo dos servos de Deus. Aí é que vemos uma grande continuidade no novo papa, Francisco I. Não apenas no nome escolhido, que nos remete a S. Francisco de Assis (embora também possa remeter a S. Francisco Xavier ou a S. Francisco de Sales). É verdade, S. Francisco foi um grande exemplo de humildade, tendo deixado para trás uma grande fortuna para abraçar a pobreza evangélica, reformando profundamente a Igreja com seu exemplo. Ele também intercedeu e pediu a intercessão pelo seu predecessor. Em seguida, pediu que o povo rezasse por ele, e curvou-se perante o povo, para receber a bênção de Deus. Também se identificou decididamente com o povo romano, que ele guia como bispo daquela cidade, e com o povo de todo o mundo, que ele guia como sucessor de Pedro e pastor universal.

Vemos, nos gestos, nas palavras e no silêncio de Francisco I a humildade do servo dos servos de Deus, escancarada numa personalidade que já se demonstra cativante, mas também escondida em gestos que praticava em Buenos Aires, como preparar as próprias refeições, ou usar o transporte público. Se Cristo se humilhou, tornando-se homem e sofrendo a morte mais terrível na cruz (Fl 2,5-11), o vigário de Cristo deve seguir o mesmo caminho. É este caminho que o papa Francisco parece estar desde já trilhando.

Mulheres, exemplo

Neste dia das mulheres, gostaria de celebrar três dos mais belos exemplares desse gênero. Toda mulher que vive bem sua condição feminina é um exemplo para os homens, pois lhes são complementares (Gn 2,18-24). Ao olhar para uma mulher, um homem deveria moderar seus apetites de caçador e aprender com sua ternura e os cuidados da mulher para com os seus. A situação que vemos, da mulher subjugada pelo homem, é coisa do pecado, não é vontade de Deus (Gn 3,1-20).

A Virgem Maria

O primeiro exemplo que gostaria de recordar, como não poderia deixar de ser, é o da Virgem Maria, mãe de Deus. Quando ela disse ao anjo do Senhor “Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38), ela assumiu para si uma grande carga. A concepção sobrenatural do Filho de Deus implicava para ela um grande risco de apedrejamento, coisa que seu esposo, São José, quis evitar rejeitando-a secretamente – somente a intervenção divina, esclarecendo que Jesus foi feito pelo Espírito Santo (v. Mt 1,18-25) garantiu que se cumprisse a profecia:

Um renovo sairá do tronco de Jessé,
e um rebento brotará de suas raízes.
Sobre ele repousará o Espírito do Senhor, Espírito de Sabedoria e entendimento,
Espírito de prudência e de coragem,
Espírito de ciência e de temor do Senhor.
Sua alegria se encontrará no temor do Senhor.
Ele não julgará pelas aparências,
e não decidirá pelo que ouvir dizer;
mas julgará os fracos com equidade,
fará justiça aos pobres da terra,
ferirá o homem impetuoso com uma sentença de sua boca,
e com o sopro dos seus lábios fará morrer o ímpio.
A justiça será como o cinto de seus rins,
e a lealdade circundará seu flancos. [Is 11,1-5]

E também:

porque um menino nos nasceu, um filho nos foi dado;
a soberania repousa sobre seus ombros, e ele se chama:
Conselheiro admirável, Deus forte, Pai eterno, Príncipe da paz.
Seu império será grande e a paz sem fim sobre o trono de Davi e em seu reino.
Ele o firmará e o manterá pelo direito e pela justiça, desde agora e para sempre. Eis o que fará o zelo do Senhor dos exércitos. [Is 9,5s]

O “sim” de Maria a Deus foi, portanto, um grande peso sobre seus ombros, que somente sua virtude poderia suportar, afinal, não gerou um filho para si, mas para o mundo. “Na verdade, [ó Deus,] fizestes grandes coisas por toda a terra e estendestes a vossa misericórdia a todas as gerações, quando, olhando a humildade de vossa Serva, nos destes, por ela, o Salvador da humanidade, vosso Filho, Jesus Cristo, Senhor nosso” (Missal Romano – MR -, prefácio da Virgem Maria, II). A Virgem teve de amar com um amor semelhante ao de Deus: “com efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16). Em seu “sim”, Maria assumiu para si as dores de seu filho, assegurou par si mesma uma espada a transpassar sua alma (Lc 2,35).

Acolhendo a vossa Palavra no coração sem mancha, mereceu concebê-lo no seio virginal e, ao dar à luz o Fundador, acalentou a Igreja que nascia. Recebendo aos pés da cruz o testamento da caridade divina, assumiu todos os seres humanos como filhos e filhas, renascidos para a vida eterna, pela morte de Cristo.

Ao esperar com os Apóstolos o Espírito Santo, unindo suas súplicas às preces dos discípulos, tornou-se modelo da Igreja orante.

Arrebatada à glória dos céus, acompanha até hoje com amor de mãe a Igreja que caminha na terra, guiando-lhe os passos para a pátria, até que venha o dia glorioso do Senhor. [MR, prefácio da Virgem Maria, III]

Santa Gianna Beretta Molla

Santa Gianna Beretta MollaSanta Gianna, médica pediatra, nascida na Itália, queria vir com seu irmão, Pe. Alberto, também médico, fundar um hospital em Grajaú, no Maranhão – onde aliás, foi reconhecido um de seus milagres, salvando a vida de uma criança gestada desde os três meses sem líquido amniótico. Essa dedicação aos nascituros já seria esperada de uma santa pediatra, mas não foi só isso que ela fez.

Ainda em vida, aos 38 anos (em 1961), engravidou de sua quarta filha, que viria a se chamar Gianna Emanuela. Durante a gestação, foi diagnosticada com um fibroma no útero, tendo apenas três opções: a retirada do útero com a consequente morte da filha, o abortamento provocado, ou uma cirurgia arriscada para manter a gestação. Optou pela última, dando à luz uma menina aos 21 de abril de 1962, vindo a falecer sete dias depois. Morreu por amor à filha. Essa opção não deveria ser estranha – que pai ou mãe amoroso, ao perder um filho, não disse ao Senhor: “leva-me, mas preserva a vida desta criança”? É uma decisão difícil, mas mais difícil é a terrível espada que transpassa o coração de quem perde um filho. Santa Gianna Beretta Molla se deu para que sua filha vivesse.

Santa Teresa Benedita da Cruz (Santa Edith Stein)

Santa Teresa Benedita da Cruz (Santa Edith Stein)Outra formidável flor do ramo de Jessé, Edith Theresa Hedwing Stein, judia e ateia, primeira mulher a doutorar-se em filosofia na Alemanha, converteu-se ao cristianismo após ler a autobiografia de Santa Teresa d’Ávila (S. Teresa de Jesus), Livro da Vida. Já então experimentou sua primeira provação, pois foi rejeitada pela família, que não aceitava sua fé cristã. Na universidade, a discípula de Husserl, fundador da fenomenologia, tinha uma carreira promissora, que foi interrompida pouco após a acensão dos nazistas ao poder.

Tendo sido impedida de lecionar, pôde realizar seu sonho de entrar para o Carmelo Descalço, o que ocorreu em 1933, adotando o nome de Teresa Benedita da Cruz. Com permissão de seus superiores, não deixou de estudar e de escrever, bem como de se preocupar com o destino do povo alemão. Escreveu ainda naquele ano uma carta ao papa Pio XI, suplicando a palavra da Igreja contra as atrocidades do regime nazista. Tal palavra veio a ser pronunciada em 1937, na encíclica Mit Brennender Sorge.

Durante a guerra, recrudesceu a perseguição aos judeus a tal ponto que a Ordem Carmelita Descalça determinou sua transferência para um convento na Holanda. Mas, em 1942, a conferência episcopal holandesa denunciou o racismo dos nazistas, o que foi usado como pretexto para que a perseguição alcançasse os judeus convertidos ao catolicismo, entre eles, a santa e sua irmã. Levada para o campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, dedicou-se a cuidar dos outros presos. Seus cuidados chegaram ao ponto de dar sua vida para salvar uma criança.

Brilhante filósofa e brilhante cristã, aceitou sofrer para o bem de muitos:

Desde já, aceito a morte que Deus me destinou, enfrentando-a com alegria, em perfeita submissão à sua santíssima vontade. Peço ao Senhor que aceite minha vida e minha morte para sua glória e louvor, por todas as necessidades […] da Igreja […] e para que o Senhor seja aceito pelos seus [os judeus], e seu Reino venha em glória, pela salvação da Alemanha e pela paz no mundo; enfim, pelos meus parentes, vivos e falecidos, e por todos os que Deus me deu: que nenhum deles se perca. [STEIN, Edith. Na força da cruz. 3. ed. rev. e atual. Vargem Grande Paulista: Cidade Nova, 2008. p. 97.]

2.º domingo da quaresma – a Transfiguração de Jesus Cristo

São riquíssimos os textos lidos neste domingo na missa. Abordarei aqui e nas próximas postagens alguns aspectos teológicos dos mesmos. A leitura do Evangelho foi tirada de Lc 9 28b-36, que possui paralelos em Mt 17,1-9 e Mc 9,2-10:

Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, e subiu ao monte para orar. Enquanto orava, transformou-se o seu rosto e as suas vestes tornaram-se resplandecentes de brancura. E eis que falavam com ele dois personagens: eram Moisés e Elias, que apareceram envoltos em glória, e falavam da morte dele, que se havia de cumprir em Jerusalém. Entretanto, Pedro e seus companheiros tinham-se deixado vencer pelo sono; ao despertarem, viram a glória de Jesus e os dois personagens em sua companhia. Quando estes se apartaram de Jesus, Pedro disse: “Mestre, é bom estarmos aqui. Podemos levantar três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias!…”. Ele não sabia o que dizia. Enquanto ainda assim falava, veio uma nuvem e encobriu-os com a sua sombra; e os seus discípulos, vendo-os desaparecer na nuvem, tiveram um grande pavor. Então da nuvem saiu uma voz: “Este é o meu filho muito amado; ouvi-o!”. E, enquanto ainda ressoava esta voz, achou-se Jesus sozinho. Os discípulos calaram-se e a ninguém disseram naqueles dias coisa alguma do que tinham visto. [Lc 9,28b-36]

Muitos cientistas perscrutam o cosmos em busca da origem do universo. Seus esforços, porém, são inúteis, porque a matéria que enxergam está submetida ao tempo, e portanto precisa sempre de um precedente e leva sempre a uma consequência. Enquanto procurarem nela, sempre haverá uma origem anterior a ser procurada. Nessa passagem bíblica, porém, a origem última de tudo o que existe, aquele que dá existência a tudo (Cl 1,15-17), manifesta-se em sua glória.

O que era desde o princípio, o que temos ouvido, o que temos visto com os nossos olhos, o que temos contemplado e as nossas mãos têm apalpado no tocante ao Verbo da vida – porque a vida se manifestou, e nós a temos visto; damos testemunho e vos anunciamos a vida eterna, que estava no Pai e que se nos manifestou -, o que vimos e ouvimos nós vos anunciamos, para que também vós tenhais comunhão conosco. [1Jo 1,1s]

Foi a própria vida que se manifestou no monte, revelando sua glória. Veja bem que, dentre os homens, apenas Jesus Cristo manifestou sua glória, pois a ele, que é Deus com o Pai e o Espírito Santo, a glória pertence. Mas também estes dois se manifestaram, repetindo assim o testemunho dado quando do batismo de Cristo (Mt 3,16s; Jo 1,32-34): “Eis meu filho amado”; o Espírito, que se havia manifestado como pomba, aparece como nuvem, como sopro (cf. Catecismo da Igreja Católica [CEC], 554-556). A tenda da glória de Deus (v. Ex 25,8; 33,7-11) está aí, por isso Pedro “não sabia o que dizia” – já não é mais necessário erguer uma tenda ou um templo para que Deus nele habite, pois Deus já está conosco (cf. Mt 1,23; Ap 21,3).

É loucura, portanto, procurar a origem de tudo nas coisas passageiras, quando a própria Palavra que tudo criou e que tudo sustenta se manifestou a nós, como conhecemos do testemunho dos apóstolos e da Escritura. E mais ainda, o destino de tudo também nos foi aí revelado, como ouvimos na segunda leitura:

Irmãos, sede meus imitadores, e olhai atentamente para os que vivem segundo o exemplo que nós vos damos. Porque há muitos por aí, de quem repetidas vezes vos tenho falado e agora o digo chorando, que se portam como inimigos da cruz de Cristo, e cujo destino é a perdição, cujo deus é o ventre, para quem a própria ignomínia é causa de envaidecimento, e só têm prazer no que é terreno. Nós, porém, somos cidadãos dos céus. É de lá que ansiosamente esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará nosso mísero corpo, tornando-o semelhante ao seu corpo glorioso, em virtude do poder que tem de sujeitar a si toda criatura.

Portanto, meus muito amados e saudosos irmãos, alegria e coroa minha, continuai assim firmes no Senhor, caríssimos. [Fl 3,174,1]

Somos destinados, portanto, à glória de Cristo, ao qual seremos tornados semelhantes pelo poder de Deus, se procurarmos imitá-lo. Jesus Cristo é a origem e o fim de tudo (Cl 1,16; Ap 1,8; 22,13). Não há que se procurar origem e finalidade em outro lugar, se não se quiser enganar.

Quarta-feira de cinzas

Hoje se inicia o tempo da quaresma. A cor roxa nos paramentos litúrgicos nos convida à conversão. O jejum que fazemos hoje (alimentar-se apenas uma vez, ou mesmo comer moderadamente em três refeições, para aqueles que podem) nos faz lembrar a fraqueza de nossa condição pecadora, para que depositemos em Deus nossa confiança. Esse é também o tempo em que os antigos faziam a catequese dos que postulavam ao batismo e, quando se encerra esse tempo, ao celebrarmos a ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo na vigília pascal, ainda hoje se batizam os adultos. É tempo de conversão, de voltar-se para Deus, de meditar sobre a vitória de Jesus Cristo sobre a tentação e o pecado, para em seguida celebrarmos a nova vida na ressurreição do Cristo, aquele que detém as chaves para nos libertar da morte.

Deixo-vos as preces de hoje nas laudes, o ofício da Liturgia das Horas celebrado no início do dia, que bem resumem esse tempo:

Demos graças a Deus Pai, que nos concede o dom de iniciar hoje o tempo quaresmal. Supliquemos que durante estes dias de salvação ele purifique e confirme os nossos corações na caridade, pela vinda e ação do Espírito Santo. Digamos, pois, cheios de confiança:
R. Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito Santo!

Ensinai-nos a saciar o nosso espírito, com toda palavra que brota de vossos lábios.
R. Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito Santo!

Fazei que pratiquemos a caridade, não apenas nas grandes ocasiões, mas principalmente no cotidiano de nossas vidas.
R. Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito Santo!

Concedei que saibamos renunciar ao supérfluo, para podermos socorrer os nossos irmãos necessitados.
R. Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito Santo!

Dai-nos trazer sempre em nosso corpo os sinais da Paixão de vosso Filho, vós que nos destes a vida em seu corpo.
R. Dai-nos, Senhor, o vosso Espírito Santo!

(Intenções livres)

Pai nosso que estais nos céus,
santificado seja o vosso nome;
venha a nós o vosso reino,
seja feita a vossa vontade,
assim na terra como no céu;
o pão nosso de cada dia nos dai hoje;
perdoai-nos as nossas ofensas,
assim como nós perdoamos
a quem nos tem ofendido,
e não nos deixeis cair em tentação,
mas livrai-nos do mal.

Concedei-nos, ó Deus todo-poderoso, iniciar com este dia de jejum o tempo da Quaresma, para que a penitência nos fortaleça no combate contra o espírito do mal. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Amém!

A renúncia do papa Bento XVI

É provável que vocês já saibam – o papa Bento XVI renunciou a seu cargo à frente da diocese de Roma e da Igreja cristã. Não é uma situação nova, pois outros papas antes dele já haviam feito o mesmo, mas, claro, é uma notícia que nos pega desprevenidos. Quantos não terão pensado: o que poderá ter acontecido para levar o papa a renunciar? Aparentemente, o que o levou a tal gesto foi a grande consciência que tem da Igreja e do seu papel como condutor dela – é o que transparece do texto de sua renúncia, reproduzido abaixo.

O exemplo do papa

O gesto de Bento XVI é um exemplo de imitação do Cristo, Nosso Senhor. Sim, porque ele não se apegou a ser o vigário de Cristo, o sucessor de Pedro na árdua tarefa de dirigir a Igreja cristã. Em Fl 2,5-11, vemos como Jesus não se apegou a ser igual ao Pai, mas se deu em sacrifício definitivo pela remissão de nossos pecados (Hb 10,11-18). O papa não se apegou a um cargo, mas humildemente o deixou ao perceber que não tinha mais saúde para continuar a exercê-lo, dando lugar a seu sucessor e, aos eleitores do novo papa, tempo para refletir a respeito das qualidades necessárias ao próximo sucessor do apóstolo Pedro e pedir a Deus que os ilumine.

E quem não se apegaria a um cargo a cujo ocupante o Senhor garantiu a vitória sobre as forças infernais (Mt 16,18s)? Quem não se apegaria a um cargo a cujo ocupante o Senhor incumbiu de confirmar na fé os seus irmãos (Lc 22,32)? Quem não se apegaria a um cargo cujo ocupante tenha por dever conduzir e governar todos os cristãos (Jo 21,15-17)? O papa Bento XVI não se apegou a esse cargo. Com humildade, ele, que é um grande teólogo, com vasta experiência em universidades e na Comissão para a Doutrina da Fé, e que não abdicou de ser teólogo para ser papa, não tentou por um decreto resolver as diferenças entre as várias correntes teológicas. Ele que, como chefe visível da Igreja constituída por Jesus Cristo, poderia fechar as portas às igrejas e grupos que se separaram, não se apegou a seu poder, e esteve sempre aberto ao diálogo. Ele poderia se aferrar ao poder temporal e espiritual do bispo de Roma, mas abdicou desse poder em favor de outrem, alguém que melhor possa exercê-lo, pois a idade já não lhe o permite.

Momento de oração

O momento não é para dúvidas, angústias ou sofrimento. Ao contrário, é de confiança e entrega a Deus. É um momento de oração, por Bento XVI, pelo conclave que se reunirá no próximo mês, e pelo papa que será eleito. Devemos primeiro agradecer ao Senhor pela benção que foi o pontificado beneditino. Num tempo em que há tanto mal a dominar esse mundo tenebroso (Ef 6,12), nos fez lembrar daquele monge que, há cerca de 1.600 anos, nos legou um grande exemplo de vida virtuosa, de confiança em Deus e de luta contra as trevas, deixando-nos inclusive a poderosa oração que leva seu nome, além da regra de vida monástica que serviu de base para os mosteiros que preservaram valiosos manuscritos antigos e foram a base para a grande renovação da Igreja há cerca de mil anos.

Esse período após o anúncio da renúncia, a ser efetivada no final do mês, e que incluirá em março a realização do conclave para eleição do novo papa e os primeiros dias do pontificado deste, não à toa coincide com a quaresma, quando buscamos a conversão a Deus e lembramos a vitória de Jesus Cristo sobre a tentação. É um período de penitência, mas também é um período de abandono de tudo aquilo que nos afasta de Deus. E, este ano, será um período em que a Igreja inteira deverá se unir em oração para que Deus ilumine, abençoe e proteja Bento XVI, os cardeais eleitores e o novo papa.

Não falta proteção a nós, que somos o corpo de Cristo (Ef 5,21ss). Recorramos a nossa mãe, Maria Santíssima, e a São Miguel Arcanjo, príncipe e protetor da Igreja de Cristo (Dn 12,1), pedindo sua intercessão para que Deus esteja com todos nós e conduza sua Igreja. Amém.

São Miguel Arcanjo, defendei-nos no combate, sede nosso refúgio contra a maldade e as ciladas do demônio. Ordene-lhe Deus, instantemente o pedimos, e vós, príncipe da milícia celeste, pela virtude divina, precipitai no inferno a Satanás e a todos os espíritos malignos que andam pelo mundo para perder as almas.

São Miguel Arcanjo, defendei-nos e protegei-nos. Amém!

A renúncia do papa Bento XVI

Caríssimos Irmãos,

Convoquei-vos para este Consistório não só por causa das três canonizações, mas também para vos comunicar uma decisão de grande importância para a vida da Igreja. Depois de ter examinado repetidamente a minha consciência diante de Deus, cheguei à certeza de que as minhas forças, devido à idade avançada, já não são idôneas para exercer adequadamente o ministério petrino. Estou bem consciente de que este ministério, pela sua essência espiritual, deve ser cumprido não só com as obras e com as palavras, mas também e igualmente sofrendo e rezando. Todavia, no mundo de hoje, sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida da fé, para governar a barca de São Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário também o vigor quer do corpo quer do espírito; vigor este, que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado. Por isso, bem consciente da gravidade deste ato, com plena liberdade, declaro que renuncio ao ministério de Bispo de Roma, Sucessor de São Pedro, que me foi confiado pela mão dos Cardeais em 19 de Abril de 2005, pelo que, a partir de 28 de Fevereiro de 2013, às 20,00 horas, a sede de Roma, a sede de São Pedro, ficará vacante e deverá ser convocado, por aqueles a quem tal compete, o Conclave para a eleição do novo Sumo Pontífice.

Caríssimos Irmãos, verdadeiramente de coração vos agradeço por todo o amor e a fadiga com que carregastes comigo o peso do meu ministério, e peço perdão por todos os meus defeitos. Agora confiemos a Santa Igreja à solicitude do seu Pastor Supremo, Nosso Senhor Jesus Cristo, e peçamos a Maria, sua Mãe Santíssima, que assista, com a sua bondade materna, os Padres Cardeais na eleição do novo Sumo Pontífice. Pelo que me diz respeito, nomeadamente no futuro, quero servir de todo o coração, com uma vida consagrada à oração, a Santa Igreja de Deus.

Vaticano, 10 de Fevereiro de 2013.

BENEDICTUS PP XVI