Arquivo da categoria: Brasil

Lula reinstala comissão sobre mortos e desaparecidos políticos

(Agência Brasil) A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos foi reinstalada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O despacho com a medida está publicado na edição do Diário Oficial da União desta quinta-feira (4). O documento restabelece o colegiado nos mesmos moldes previstos de quando foi criada, em 1995, pela Lei nº 9.140/1995.

Recuperação de ossadas de presos políticos no Cemitério Dom Bosco, em Perus, São Paulo. (Marcelo Vigneron/Memorial da Resistência)

Encerrada em dezembro de 2022, no governo de Jair Bolsonaro, a comissão tem como atribuição tratar de desaparecimentos e mortes de pessoas em razão de atividades políticas no período de 2 setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979. Entre outros pontos, cabe à comissão mobilizar esforços para localizar os restos mortais das vítimas do regime militar e emitir pareceres sobre indenizações a familiares.

Em 2002, a comissão especial passou a examinar e reconhecer casos de morte ou desaparecimento ocorridos até 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição Federal. E, em 2004, os critérios para reconhecimento das vítimas da ditadura militar foram ampliados para reconhecer pessoas mortas por agentes públicos em manifestações públicas, conflitos armados ou que praticaram suicídio na iminência de serem presas ou em decorrência de sequelas psicológicas resultantes de torturas.

No início do governo Lula, em 2023, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania adotou medidas administrativas e jurídicas para o restabelecimento da comissão. O Ministério Público Federal também recomendou a reinstalação considerando que a extinção da comissão ocorreu de forma prematura, já que existem casos pendentes de vítimas, incluindo os desaparecimentos da Guerrilha do Araguaia e as valas encontradas nos cemitérios de Perus, em São Paulo, e Ricardo Albuquerque, no Rio de Janeiro.

Em julho do ano passado, a Coalizão Brasil por Memória Verdade Justiça Reparação e Democracia, grupo formado por dezenas de entidades de defesa dos direitos humanos, já havia cobrado do governo federal ações efetivas de políticas públicas de memória, verdade, justiça e reparação.

Até hoje, existem 144 pessoas desaparecidas na ditadura militar.

Composição

Lula também dispensou quatro membros da comissão, o presidente, Marco Vinicius Pereira de Carvalho, representante da sociedade civil; Paulo Fernando Mela da Costa, também representante da sociedade civil; Jorge Luiz Mendes de Assis, representante do Ministério da Defesa; e o deputado federal Filipe Barros (PL-PR), que ocupava o cargo de representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.
 
Por outro lado, o presidente da República designou como membros Eugênia Augusta Gonzaga, representante da sociedade civil que presidirá a comissão; Maria Cecília de Oliveira Adão, representante da sociedade civil; Rafaelo Abritta, representante do Ministério da Defesa; e a deputada federal Natália Bastos Bonavides (PT-RN), representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados
 
O decreto com as dispensas e nomeações também estão na edição de hoje do Diário Oficial da União.

(Até aqui o texto da Agência Brasil)

Opinião de Visão Católica

Reconhecer os crimes cometidos pelo Estado brasileiro durante a ditadura militar, revelar a verdade e preservar a memória são essenciais para evitar que um novo tempo de terror se abata sobre a sociedade brasileira. A verdade efetivamente liberta. A dignidade de cada homem e de cada mulher é uma verdade de fé. Velar pelos mortos e dar-lhes sepultura digna é um ato de misericórdia. Evitar que a repressão recaia novamente sobre padres, religiosos e leigos, sobre cristãos, pessoas com religiosidade de matriz africana, ateus, sobre democratas, comunistas, pessoas que apenas defendem o direito de filhos, maridos, esposas, pais e mães terem uma opinião política – evitar uma nova ditadura é um dever.

Você que chegou até aqui, aproveite e acompanhe a leitura do Compêndio da Doutrina Social da Igreja pelo Visão Católica no Youtube.

Após despejo com prisão de padre e defensora no MT, famílias acampam ao lado de fazenda e dizem sofrer ameaças

(Brasil de Fato) Acampados à beira da estrada sob fios de alta tensão e à margem da fazenda Cinco Estrelas, na zona rural da cidade de Novo Mundo, no Mato Grosso (MT), 74 famílias sem terra relatam estar vivendo com medo. “Estamos sofrendo ameaças de homens armados fazendo ronda. Não temos mais nosso direito de ir e vir”, relata Maria*, uma das acampadas.

Após o despejo, as cerca de 200 pessoas voltaram para a beira da estrada, onde sob lona e sem água, aguardam há 20 anos o acesso à terra – Arquivo Pessoal (Brasil de Fato)

Na última segunda-feira (27), os sem-terra ocuparam uma área sobreposta à fazenda que foi destinada, em abril, a assentamento da reforma agrária pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Horas depois, foram despejados sem ordem judicial pela Polícia Militar e por agentes da empresa de segurança privada Tática Serviços.  

Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), um homem teve o braço quebrado e uma idosa teve de ser hospitalizada. Dez trabalhadores sem terra, a defensora pública Gabriela Beck e dois representantes da CPT – entre eles, o padre Luís Cláudio da Silva – foram detidos.  

Na quarta-feira (29), o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), declarou: “Não adianta a Defensoria ir lá falar, não adianta o padre, não adianta o bispo, não adianta o político, o deputado”. Ao RD News, um jornal local, ele afirmou: “Quem tem posse vai ter a proteção da polícia do nosso estado”. 

Área já destinada para reforma agrária

A posse dos 4,3 mil hectares da área em questão, no entanto, é da União. Foi este o entendimento da Justiça em 2020, em decisão de primeira instância. É por isso que o Incra emitiu portaria de assentamento definitivo das 74 famílias, destinando 2 mil hectares desse território para o Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Novo Mundo.

Um recurso contra a decisão de primeira instância foi impetrado em nome de Clayton Rodrigues da Cunha, que reivindica a propriedade dos 4,3 mil hectares. Esse mandado de segurança, no qual argumenta que a área é usada para criação de gado e plantio de soja e milho, ainda não foi julgado em segunda instância, representada pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, em Brasília. Enquanto o TRF não aprecia o caso, o conflito se acirra no norte do Mato Grosso. 

As famílias já levam 20 anos debaixo de lona e sem água à beira da estrada, esperando a autorização judicial para serem assentadas definitivamente. “Estamos correndo risco aqui. Temos idosos e muitas crianças, inclusive de colo”, diz Maria.   

Em nota, a CPT denuncia que o despejo foi feito em ação “coordenada” entre a PM e os seguranças da Tática Serviços – referidos pela Pastoral como “jagunços da Fazenda”, “a mando do grileiro Clayton”.  

“Além de diversas prisões arbitrárias, a Polícia Militar de Mato Grosso demonstrou uma perceptiva relação com a empresa de segurança, que ajudou ativamente nesta ação truculenta, além de indicarem quem deveria ser preso. Os seguranças tomaram os celulares dos detidos e asseguraram a permanência deles nos ônibus escolares do Programa Caminhos da Escola”, descreve a Comissão Pastoral da Terra. 

“Com escudos, bombas, armas de grosso e spray de pimenta foram acionadas a mando do governador, segundo o próprio major que comandou a operação disse”, informa a CPT. 

Brasil de Fato falou por telefone com o dono da Tática Serviços. Wagner Vieira confirmou que os agentes participaram da ação de despejo, mas negou que tenham reprimido os trabalhadores sem terra. Segundo ele, os seguranças ficaram “na porteira”.  

Questionado sobre quem acionou a empresa de segurança privada para atuar no despejo, Vieira informou que nada mais falaria e consultaria seu advogado. O espaço para manifestação segue aberto. 

A reportagem também pediu posicionamento para a Secretaria de Segurança Pública do governo de Mauro Mendes e para o Incra. As respostas não chegaram até o fechamento deste texto. Caso venham, a matéria será atualizada.

* Nome alterado para preservação da fonte. 

Lula reafirma: Israel pratica genocídio de palestinos

Em evento na Petrobras, o presidente Lula reafirmou sua posição a favor da criação de um Estado palestino independente coexistindo com Israel e que este país está cometendo um genocídio de palestinos. “Não troco minha dignidade”, ele afirmou. A declaração ocorreu após Israel reagir à comparação feita por Lula entre o genocídio em Gaza e o holocausto, que gerou reações do governo israelense e a retirada dos embaixadores de ambos os países.

O que o governo de Israel está fazendo contra o povo palestino não é guerra,é genocídio! Porque está matando mulheres e crianças. O que está acontecendo em Israel é um genocídio. São milhares de crianças mortas, e não estão morrendo soldados, mas mulheres e crianças dentro de hospital

(Foto em destaque: Ricardo Stuckert/PR)

Mais de 50 prisões de São Paulo tiveram racionamento de água na semana mais quente do ano

(Agência Pública) Enquanto as agências meteorológicas registraram recordes de temperatura na região Sudeste, presos de pelo menos 51 unidades prisionais, em 30 municípios do estado de São Paulo, enfrentaram o calor extremo com privação de água e de alimentos. A denúncia é da organização Mães do Cárcere, que recebeu relatos de familiares de presos sobre racionamento de água, alimentação inapropriada e negligência à saúde.

Ao todo, São Paulo tem 182  unidades prisionais. Na Penitenciária II de São Vicente, no litoral paulista, por exemplo, uma carta coletiva escrita pelos detentos, enviada à organização Mães do Cárcere, denuncia que presos tiveram apenas “uma hora diariamente” de acesso à água para beber. A carta foi obtida pela Agência Pública com exclusividade.   “Referente a água, não estamos tendo para fazer nossa higiene pessoal, nem para beber e nem para tomar banho. Água tá [disponível] uma hora diariamente”, diz um trecho. 

Em 16 de novembro, a temperatura no município de Potim, há 190 quilômetros da capital paulista,  ultrapassou os 33°C– com sensação de 40ºC. Neste dia, a organização Mães do Cárcere recebeu a denúncia da esposa de um dos presos, sobre o acesso e a qualidade duvidosa da água na Penitenciária Potim II. “Meu marido disse que a água está com bichos, que tem que ficar coando a água para beber – sem contar que a água de lá é super quente, sai fervendo do chuveiro e das torneiras”, diz a mensagem, que foi compartilhada com a reportagem.

Lívia Correia Tinoco, do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo, esteve na unidade de Potim II durante a semana de recorde de calor. Ela disse que a pouca água distribuída aos presos “vem quente e com mau cheiro”. 

Durante uma inspeção, em agosto deste ano, presos já haviam relatado à Defensoria que a água fornecida no presídio é imprópria para consumo. A defensora pública Lívia conta que, ao longo da inspeção, ouviu relatos de que os “presos estavam sem água há mais de 10 horas”. “Não tem um padrão de racionamento. O racionamento ocorre de maneira aleatória e sem prazo para iniciar e para acabar”, diz a defensora. 

Segundo a Defensoria, como a água sai muito quente das torneiras, eles também precisam usar garrafas pet para armazenar o líquido, até que ele esfrie. Em uma foto tirada pela defensora Lívia, é possível ver muita sujeira em uma das garrafas em que os presos armazenam a água. 

Em entrevista com os presos durante a inspeção, de acordo  a coordenadora do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública (NESC), Mariana Borgheresi Duarte, os internos confirmaram o racionamento de água e informaram que possuem poucos recipientes e em mau estado para armazenarem água a ser utilizada durante os períodos de racionamento.

A direção do presídio negou o racionamento de água. Na Penitenciária do Pontal,  a 367 quilômetros da cidade de São Paulo, contudo,  o NESC identificou um aviso, na parede do pavilhão de convívio, onde constam os horários de racionamento da água ao longo do dia. A direção da penitenciária não respondeu os questionamentos da reportagem sobre o racionamento de água até a publicação.

Em Potim II, a capacidade total de presos é de 844 no regime fechado e 219 no semiaberto. Até o fechamento da reportagem, conforme informação disponível no site da SAP, 1219 detentos estão no fechado e 294 no aberto. A capacidade total é de 1.063 pessoas, porém há 1.513  detentos no momento, uma superlotação de 30%. 

Além da superlotação, o calor extremo é intensificado pela própria estrutura da unidade prisional. No setor reservado aos presos que cumprem pena no regime semiaberto, a defensora conta que as estruturas de ferro impedem a circulação do ar.  “Esta ala é surreal. São duas alas que abrigam uns 100 presos em cada e ela tem somente uma porta de ferro, com uma chapa de ferro, de aço ali na porta, o que já impede toda a ventilação pela frente e na parte lateral, tem um espaço muito pequeno para a entrada do ar.”

No início de outubro, a Defensoria enviou um pedido de providências ao Departamento Estadual de Execuções Criminais de São José dos Campos – DEECRIM, sob comando do juiz corregedor Dr. Luiz Guilherme Cursino De Moura, denunciando os problemas encontrados na penitenciária de Potim II. No documento, o órgão descreve que entrou em contato com a Vigilância Sanitária Municipal e recebeu a informação que a concessionária Águas de Potim, “está realizando o tratamento de água do município, mas que esse tratamento não abrangeria a área da penitenciária. Em contato com a concessionária do serviço público, essa informação foi confirmada”. 

Na tentativa de analisar a potabilidade da água fornecida na penitenciária, a Defensoria pediu para que a Vigilância Sanitária e a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) fossem até a unidade para colher amostra do líquido, no entanto, os órgãos não realizaram a análise. A CETESB respondeu ao pedido que a competência da Companhia dizendo que “a análise é de responsabilidade da Secretaria de Vigilância em Saúde”. 

Já a Vigilância Sanitária informou que “foi até ao estabelecimento prisional, porém foram impedidos de realizar a coleta de água, pois a direção local da unidade prisional afirmou que não seriam competentes para a dita análise”.

Preso teria desmaiado dentro do camburão por causa do calor

No dia 14 de novembro, a temperatura máxima prevista para a capital paulista era de 37°C, com sensação térmica de 40°C. Neste dia, o Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo recebeu notícia que um homem chegou a desmaiar três vezes dentro do camburão, durante o trajeto para uma audiência de custódia no Fórum Criminal da Barra Funda, no centro de São Paulo. 

De acordo com o Núcleo, não havia ventilação dentro do camburão e isso teria feito com que ele tivesse passado mal. Uma defensora pública tirou uma foto da cadeira que o acusado sentou no Fórum. Nela é possível ver marcas de suor no assento e no chão.

“Infelizmente, não se trata de um caso isolado. Em audiências de custódia os custodiados relatam calor em excesso e falta de ventilação tanto no camburão quanto na viatura. Além disso, o racionamento de água nas unidades prisionais, somado à falta de ventilação nas celas e à superlotação leva ao adoecimento e toda sorte de violação de direitos das pessoas presas”, comenta Duarte.

Marcas de suor visíveis na cadeira que o acusado se sentou no Fórum da Barra Funda

De acordo com a defensora, o Núcleo pediu ao juiz corregedor de presídios que a Secretária de Administração Penitenciária (SAP) seja oficiada com urgência para esclarecer se os veículos possuem ventilação apropriada e quais providências são adotadas para adaptá-los, ante a extrema onda de temperaturas elevadas. 

Até o fechamento da reportagem, a Defensoria não obsteve resposta da SAP. O pedido foi feito no dia 14 de novembro, em 17 de novembro o juiz solicitou à SAP que respondesse aos esclarecimentos solicitados pela Defensoria. No dia 22/11 o cartório enviou o ofício à SAP.

A reportagem questionou a Secretaria. Mas a SAP disse apenas que, no dia 14 de novembro, uma reeducanda passou por atendimento médico devido ao trajeto sinuoso  da unidade até o Fórum da Barra Funda. “Ela foi medicada e teve alta no mesmo dia”, diz a nota.

Em relação a ventilação dentro dos veículos que transportam os presos, a Secretaria sustenta que os carros “contam com um sistema de ventilação composto por ventilador e exaustor, acionados pelo motorista, bem como aberturas laterais para auxílio da entrada de ar quando o carro estiver em movimento”.

“Pasta de dente com papel higiênico para matar a fome”

Além da falta de água, a população carcerária enfrenta as altas temperaturas sem acesso à alimentação adequada. Em outra mensagem enviada à organização Mães do Cárcere, compartilhada com a reportagem, a esposa de um detento da penitenciária Potim II diz que os presos estariam“ comendo até pasta de dente com papel higiênico para matar a fome”.  

Outra esposa de um detento diz, em denúncia enviada à organização, que  nas visitas, o marido sempre fala que está passando fome. “Ele emagreceu muito depois que foi de bonde para Potim, não sabe quantos quilos exatamente ele perdeu porque não tem atendimento médico.” 

Segundo relatório de inspeção da Defensoria Pública, na penitenciária de Potim II, “a comida é muito ruim, que não atende padrões adequados de higiene e a quantidade fornecida é pequena, não sendo suficiente para saciarem a fome.” Entre os relatos reproduzidos no documento, os detentos disseram que muitas vezes recebem alimentos crus e salada sem esterilização adequada “com larvas, pedras e até com unhas”.

No Centro de Detenção Provisória (CDP) de Guarulhos, Região Metropolitana de São Paulo, uma mensagem de familiar de um detento, enviada às Mães do Cárcere, relata que, por causa do calor, a comida estava chegando estragada em consequência das altas temperaturas e a má conservação dos alimentos na unidade prisional. “O feijão está vindo podre, por conta do calor a comida vem azeda. Fica horas no caminhão sem refrigeração”, diz um trecho 

Questionada sobre questões de higiene relacionadas a alimentação, a SAP informou que “ela é feita a partir de cardápio elaborado por nutricionistas e uma comissão de recebimento atesta a qualidade de cada refeição antes dela ser entregue aos presos; o fornecimento de alimentação à população prisional segue rigorosamente o “Cardápio Padrão” que padronizou as refeições servidas nas unidades prisionais de todo o Sistema. A alimentação é preparada pelos próprios custodiados nas cozinhas das unidades prisionais, tudo conforme os padrões e regras da Vigilância Sanitária.”

A reportagem questionou a Secretária de Administração Penitenciária (SAP) sobre a ventilação nas alas de Potim e nas outras unidades, segundo nota enviada à Pública, o órgão nega a existência de chapas de aço nas grades. “Há aberturas nos fundos das celas para circulação de ar e portas somente com grades, sem chapas de aço”. 

Em relação a denúncia de racionamento de água das 51 unidades prisionais do estado, a SAP afirma que “todos os presídios paulistas seguem o que determina a Organização Mundial de Saúde, que estipula o consumo mínimo per capita de 100 litros diários de água por pessoa”.  

Questionada sobre as medidas adotadas para mitigar o impacto das altas temperaturas nos presídios, a Secretaria  respondeu que “algumas atividades ao ar livre foram canceladas” e “há campanhas para incentivo à hidratação e a não exposição solar. O fornecimento de água chegou a ser ampliado”. Veja a nota completa.

(Por José Cícero para a Agência Pública. Licenciado pela Creative Commons BY-ND 4.0.)

Estupro e aborto

Uma menina de 10 anos que morava com a avó foi estuprada por seu tio no Espírito Santo. Após 4 anos seguidos de violência, veio uma gestação. Ontem, uma pessoa registrada como médico ministrou medicamentos que mataram o feto, já com mais de 23 semanas, e provocou sua expulsão do útero. Sem nem sequer ter chance de ir para a UTI neonatal. Muitas pessoas, se dizendo contra ou a favor do aborto, querem agora lucrar com o episódio, somente perpetuando as violências sofridas pela criança e pelo feto – o qual, pela idade gestacional, já tem direito a sepultamento. (Mas, quem o sepultará? O Estado que determinou sua morte? O médico que o matou? A família na qual ocorreu o estupro?)

As melhores respostas, cheias de indagações, foram aquelas dadas por bispos brasileiros: dom Walmor, dom Ricardo Hoepers, dom Joel Portella Amado e dom Antônio Fernando Saburido. Transcrevo abaixo o texto de dom Ricardo Hoepers, presidente da comissão Vida e Família da CNBB. Que cesse toda violência, todo mal, todo pecado!

Por que não viver?

Desde o momento que soube do assassinato da bebê de mais de 5 meses, de São Mateus (ES), com uma injeção de potássio na cavidade cardíaca da criança, em Recife (PE), cuja mãe é uma menina de dez anos, fiquei pensando, como explicar esse crime hediondo.

Por que não foi permitido esse bebê viver? Que erro ele cometeu? Qual foi seu crime? Por que uma condenação tão rápida, sem um processo justo e fora da legalidade? Por que o desprezo a tantas outras possibilidades de possíveis soluções em prol da vida? Foram muitos os envolvidos, mas o silêncio e omissão dos órgãos institucionais que têm a prerrogativa de defender a vida, se entregaram às manobras de quem defende a morte de inocentes. Por quê?

É uma história que precisa ser esclarecida. É um processo que precisa ser desvendado. Duas crianças que poderiam viver… teve laudo técnico a favor da vida, teve suporte profissional a favor da vida, teve hospital disposto a cuidar até o fim da gestação, tiveram todas as condições de salvar as duas vidas, mas, de repente, uma transferência, de um Estado para o outro, e toda uma mobilização para que o aborto fosse realizado. Nas mãos de quem ficou a tutela dessa menina, quem decidiu tudo por ela?

Por que a obsessão de apresentar uma única saída? Por que burlar as leis para alcançar esse objetivo de usar de uma criança para um intento assassino?

Difícil raciocinar o que aconteceu, como aconteceu e porque terminou assim!

Ministério Público do Espírito Santo, Conselho Tutelar, Secretários Municipais da Saúde de Vitória e Recife e Secretários Estaduais da Saúde do Espírito Santo e de Pernambuco têm muitas explicações a dar à sociedade brasileira. Por que foi rejeitado um laudo técnico de profissionais e o suporte dos mesmos, obrigando o hospital a dar alta e subitamente transferir a menina-mãe para um hospital em outro Estado? Há claramente um abuso de poder que merece ser investigado.

Mas, de tudo isto, ainda resta a pergunta: por que o bebê não pôde viver? Por que foi sentenciado à morte, mesmo sendo inocente, e tendo todas as condições para vir à vida com os devidos cuidados e com o apoio técnico profissional à disposição? Por que optaram pela morte e não pela vida, desrespeitando a lei, pois se tratava de um bebê de 22 semanas?

Se não somos capazes nem de defender a nossa própria espécie, que tipo de humano estamos nos tornando? Estamos negando nossa própria humanidade. A violência do estupro e do abuso sexual é infame e horrenda, mas a violência do aborto provocado em um ser inocente e sem defesa é tão terrível quanto. Ambos são crimes. Apontam como sinais da degradação moral e da decadência dos costumes, ferindo os valores mais sublimes como o respeito à dignidade do ser humano e a sacralidade do valor da vida!

Mesmo sendo rechaçados pelo nosso discurso religioso em prol da vida, quero dizer que não se trata de nenhum fundamentalismo, mas do uso da reta razão. Quando vem à mente um tema tão básico, tão racional, tão científico, tão antigo, de uma regra de ouro que é uma verdade basilar e aceita por qualquer sociedade civilizada: “Não matarás um inocente”, então nos perguntamos: Por que estão matando nossas crianças? Ou perdemos o fio da história ou nos tornamos reféns de uma razão autodestrutiva, que se odeia e, por isso, mata o seu futuro antes dele nascer…

Hoje faço uma prece por todas as crianças que gostariam nascer, brincar, chorar e viver, mas, foram assassinadas antes de nascer! Esperamos explicações e respostas sobre esse caso. Chega de violência! Não ao aborto! Escolhe, pois, a vida (Dt, 30,19).

Rio Grande-RS, 17 de agosto de 2020.

Dom Ricardo Hoepers
Presidente da Comissão Vida e Família da CNBB

(Foto em destaque: feto de 24 semanas. Fonte: National Geographic.)

STF referenda medidas de enfrentamento da Covid-19 em terras indígenas

STF – O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), na sessão desta quarta-feira (5), confirmou determinação para que o governo federal adote medidas de contenção do avanço da Covid-19 nas comunidades indígenas. Os ministros referendaram decisão cautelar concedida parcialmente pelo ministro Luís Roberto Barroso na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, em que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, em conjunto com seis partidos políticos (PSB, PSOL, PCdoB, Rede, PT, PDT), argumentam que há falhas e omissões do governo federal no combate ao coronavírus nas aldeias indígenas.

A maioria dos ministros concordou com todas as medidas deferidas na cautelar pelo ministro Luís Roberto Barroso, relator da ADPF, como a criação de barreiras sanitárias e sala de situação, a retirada de invasores e a apresentação de plano de enfrentamento. Na sessão de segunda-feira (3), Barroso havia votado pela ratificação integral da liminar, em que foi negada apenas o pedido de desintrusão imediata, por entender que os invasores devem ser removidos somente após um plano produzido pela União.

Barreiras sanitárias e sala de situação

Segundo o entendimento unânime da Corte, há necessidade de criação de barreiras sanitárias, em razão da vulnerabilidade dos indígenas, que devem permanecer isolados para assegurar maior proteção. Os ministros também convergiram sobre a sala de situação, ressaltando que, em momentos de grande catástrofe, todos os setores envolvidos, inclusive representantes indígenas, devem atuar de maneira conjunta, em cumprimento ao princípio da eficiência.

Retirada dos invasores

O ponto mais sensível da ADPF foi a questão da retirada dos invasores. A Corte considerou a ilegalidade das ocupações, mas observou a necessidade de protocolos de atuação. A maioria votou com o relator, pela elaboração de um plano de desintrusão para que, posteriormente, ocorra a retirada dos invasores.

Infraestrutura operacional

O ministro Alexandre de Moraes, que acompanhou integralmente o relator, salientou que as desintrusões devem ser realizadas pela Polícia Federal com a ajuda das Polícias Militares locais e uma estrutura maior de apoio, formada por assistentes sociais, psicólogos, médicos e enfermeiros que, no momento, estão mobilizados no combate à pandemia. “Há todo um trabalho pré-policial para direcionamento das pessoas que lá invadiram”, disse. Segundo ele, a retirada de invasores precisa de uma infraestrutura operacional, com o estabelecimento de protocolos de atuação, daí a importância de um plano.

Julgamento cautelar

Alguns ministros também observaram que o exame da questão ainda é preliminar e que, para o julgamento de mérito da questão, a Corte precisará de um panorama sobre a situação das terras indígenas. Para eles, entre outros dados, será necessário o envio de informações detalhadas sobre a localização e a quantidade dos invasores e as condições da região, além da produção de um cronograma de retirada.

Mapeamento e força-tarefa

Na sessão de hoje, o relator reafirmou que a retirada de invasores não acontece “num estalar de dedos, mas é um processo”. Trata-se, segundo ele, de dever da União, que deve apresentar um plano com um cronograma possível de ser realizado. Barroso lembrou que, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), foi instituída uma força-tarefa para o levantamento e o mapeamento das áreas em que a situação é mais grave. “Há diálogo institucional”, finalizou.

Divergência parcial

O ministro Edson Fachin apresentou divergência pontual. Para ele, a retirada dos invasores deve ser imediata, a fim de não colocar os indígenas em risco de contágio da Covid-19. Em relação aos outros pontos, Fachin acompanhou o voto do relator.

(Imagem destacada: cartilha do Conselho Indigenista Missionário – CIMI – regional Goiás/Tocantins sobre combate à COVID-19)

DF: Ibaneis liberou tudo

Ontem foi publicado o decreto do governador do Distrito Federal (Ibaneis Rocha, do MDB) liberando todas as atividades econômicas, inclusive a educação presencial. A escala vai de 7 de julho, para academias, até 3 de agosto, para escolas públicas. “Enquanto estou segurando, ele vai liberar geral?”, disse Ronaldo Caiado (DEM), governador de Goiás, onde mora grande parte das pessoas que trabalham em Brasília. A COVID-19 está completamente fora de controle no Distrito Federal.

A situação causou revolta em professores e pais de alunos. Até 1º de julho de 2020, 3.480 crianças e adolescentes já haviam sido diagnosticados com COVID-19, sem contar um número incalculável de pacientes assintomáticos. Diante um professor de história expressou sua revolta:

Governo de Brasília programa retorno às aulas para 3 de agosto. Parece piada, mas diz que é para manter regras de distanciamento nas salas de aula. Matemática básica: distância de 1,5m entre cada estudante, em uma sala de 40 metros quadrado, sendo que uma turma pequena tem 40.

A educadora Kamila expressou a dificuldade que é enfrentar a pandemia de COVID-19 na educação: “A escola que trabalho tem 1 banheiro ( isso mesmo, 1 vaso sanitário e um lavatório) para TODOS os servidores da escola.”

A Sociedade de Pediatria do Distrito Federal foi taxativa em relação ao decreto do governador:

Sabemos que muitos brasilienses não respeitam as medidas de isolamento desde que foram implementadas e que nas últimas semanas notou-se aumento da circulação e aglomeração de pessoas. Nessas condições, reabrir todas as atividades até o final de julho ou início de agosto pode ser uma decisão precipitada, devido à situação que nos encontramos tanto a nível distrital como nacional; em especial se tratando de escolas, onde o comportamento é imprevisível e o número de assintomáticos é inestimável, tornando a possibilidade de contágio exponencial. Atualmente, o Brasil é o único país que ainda apresenta média de 1000 mortos por dia, e o isolamento social é ainda, uma das poucas medidas eficazes no combate da propagação da doença.

Assim exposto, no cenário atual, a Sociedade de Pediatria do Distrito Federal não recomenda o retorno das crianças à escola.

(Foto em destaque: governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, em evento com o uso inadequado de máscaras de proteção e pouco distanciamento. Foto: Renato Alves/Agência Brasília.)

GDF não testa pacientes com sintomas leves de COVID-19

O governo do Distrito Federal (GDF) não testa pacientes com sintomas leves de COVID-19. Relato de uma paciente que buscou atendimento hoje na UBS 3 do Itapoã, e que apresentava febre, dor de garganta e anosmia (incapacidade de sentir cheiros), foi claro sobre a incapacidade de testar a população do DF: “como só tinha sete testes, a enfermeira disse para ficar em casa por oito dias e só então voltar para fazer o teste rápido”. O relato foi confirmado por uma médica da Secretaria de Estado da Saúde, que afirmou que os testes do tipo RT-PCR não são realizados em pacientes sem maiores agravos. O teste rápido, porém, se a pessoa resolver voltar ao posto de saúde para realizá-lo, pode ter sensibilidade tão baixa quanto 70% segundo o Ministério da Saúde – significando que quase uma e cada três pessoas que já tiveram COVID-19 podem ter resultado negativo. Ambas as fontes não autorizaram que seus nomes fossem revelados.

Teste rápido de COVID-19 recebido pelo Governo do Distrito Federal. Foto: Geovana Albuquerque/Agência Saúde.

Isso mostra a incapacidade do GDF de conhecer a progressão do novo coronavírus no Distrito Federal. Ainda assim, ontem foi publicado decreto do governador Ibaneis Rocha (MDB) liberando todas as atividades econômicas, inclusive escolas. Diversos pais de crianças da educação infantil e do Ensino Fundamental relataram a esta reportagem que só o que lhes permite continuar a realizar o isolamento social é justamente que as crianças não estão tendo aula, o que justifica perante os empregadores a necessidade de teletrabalho. Liberando todas as atividades, Ibaneis força as pessoas a trabalharem durante a pandemia, impedindo o isolamento e a contenção da doença.

DF: fila de 15 dias por UTI, Ibaneis quer reabrir tudo

Enquanto o Ministério Público briga na justiça para que o governo do Distrito Federal (GDF) informe detalhada e atualizadamente a situação das UTIs disponíveis para o tratamento de COVID-19, o governador Ibaneis Rocha pretende reabrir todas as atividades econômicas até agosto. O GDF afirma que apenas 61,4% dos leitos de terapia intensiva na rede pública estão ocupados. Contudo, há pacientes esperando vaga há 15 dias, numa fila de 55 pessoas. Na rede particular, pacientes também têm de esperar a liberação de vagas, visto que a ocupação de UTIs é superior a 90%.

Segundo O Estado de S. Paulo, Ibaneis não quer levar a culpa pelo sofrimento das vítimas da pandemia e de seus parentes, contudo, são os decretos que ele assina que liberam atividades econômicas e forçam as pessoas a trabalhar.

Governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, em evento com o uso inadequado de máscaras de proteção e pouco distanciamento. Na cena, Ibaneis retira a máscara para que seus perdigotos se espalhem com maior facilidade. Foto Renato Alves/Agência Brasília.

Restrição não serve mais para nada. Você não consegue mais fazer com que as pessoas fiquem em casa. O limite do isolamento já chegou. Ninguém fica em casa mais. (Ibaneis Rocha, governador do DF)

Essa fala do governador do Distrito Federal contrasta, porém, com a crescente reabertura da economia, atualmente limitada apenas quanto à educação, academias, salões de beleza, comércio ambulante, restaurantes e atividades culturais. Todo o resto está aberto, inclusive shopping centers. O povo é obrigado a ir trabalhar, o governador impede o isolamento social – para ele, “vai ser tratado como gripe, como isso deveria ter sido tratado desde o início”.

Paralisação dos entregadores por aplicativo

Hoje ocorreu em diversos locais do Brasil uma paralisação de entregadores por aplicativos. A categoria, cujo vínculo com as empresas de entrega não é reconhecido, reivindica melhores condições de trabalho. Hoje, eles não têm jornada de trabalho fixa, nem garantia de salário mínimo ou auxílio-doença, por exemplo.

Na capital paulista, segundo os organizadores, cinco mil trabalhadores se juntaram à manifestação. Entre as reivindicações da categoria estão o aumento do valor mínimo que eles recebem por entrega, o fim de bloqueios injustos e a disponibilização de equipamentos de proteção individuais. Mulheres se sentem especialmente prejudicadas, como no vídeo acima, do Sul21, em que a entregadora Ana explica, entre outras, coisas, que a linguagem do aplicativo é inadequada, e ainda piores são as bolsas de transporte, antiergonômicas.

Eis a pauta de reivindicações dos entregadores:

  • Aumento do valor por quilômetro rodado
  • Aumento do valor mínimo por entrega
  • Fim do sistema de pontuação e de restrição de local de atuação
  • Fim dos bloqueios indevidos
  • Seguro contra roubo, acidente e morte
  • Equipamentos de proteção individual e licenças durante a pandemia de COVID-19