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Estatuto da Família aprovado na Câmara

A Câmara dos Deputados aprovou ontem (24), em votação em comissão especial, o projeto de lei que institui o Estatuto da Família, de autoria do deputado Anderson Ferreira (PR-PE), com o objetivo de assegurar políticas públicas voltadas para a família, a criação de conselhos de políticas públicas para a família, a prioridade a ser dada em casos que envolvam a manutenção do núcleo familiar e a sua participação nas decisões escolares, por exemplo. O projeto define família como “núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

Em 1.º de julho deste ano, o Conselho de Direitos Humanos da ONU (CDH) aprovou resolução nesse mesmo sentido. Votaram a favor da proteção dela os países árabes e muçulmanos, os países africanos (exceto África do Sul), a Rússia, os países socialistas, a Venezuela, a Bolívia, o Paraguai, e os países asiáticos (exceto Coréia do Sul e Japão). O Brasil se absteve. Os países europeus e os EUA foram contra a resolução. Ontem, na Câmara dos Deputados, PT, PCdoB, PTN e PSol se revezaram na tentativa de adiar a votação, por serem contra o projeto. Para eles, definir família como união de um homem e uma mulher seria uma “discriminação” contra outras “formas de família” — a mesma postura foi adotada por países europeus na CDH. Em ambos os casos, aprovaram-se projetos que simplesmente defendem a família natural, sem prejudicar quem não faça parte dela.

Se não for apresentado recurso, o Estatuto da Família seguirá diretamente para apreciação do Senado Federal. Se aprovado, poderá virar lei caso seja sancionado pela presidente da República. Se for apresentado recurso, ele deverá ser votado ainda no plenário da Câmara dos Deputados.

Opinião de Visão Católica

A mixórdia de grupos contra e a favor do Estatuto da Família e da resolução da ONU demonstram como a questão é complicada e deve ser tratada com sabedoria. A postura de definir família como união de um homem e uma mulher é, evidentemente, correta e natural. Contudo, apresentam-se contrariamente aqueles que adotam o moderno relativismo, um componente capital no liberalismo que grassa a Europa e fincou raízes na América. Curiosamente, no Brasil são grupos socialistas e de esquerda que levantam a bandeira liberal, enquanto na Europa, e na América do Norte são os países de capitalismo mais desenvolvido que o fazem.

A questão vai muito além do simplismo de alguns grupos (inclusive alguns que se dizem cristãos) a respeito de um suposto “marxismo cultural” querendo destruir a família. O papel do liberalismo (que é uma das raízes do socialismo), nesse caso, fica cabalmente demonstrado: promotor de tudo o que for antinatural e anti-eclesial, pois a Lei Natural e a Igreja são o alvo principal de doutrinas que dizem que tudo deve ser permitido (liberalismo) ou que tudo deriva da ação humana (uma visão do materialismo histórico). Curiosamente, Cuba, China e Vietnã, que são países socialistas, votaram a favor da família na ONU — afinal de contas, é de reconhecer que o materialismo comporta algum espaço para a ordem natural (material), e, nesses países, os partidos comunistas não dependem de grupos minoritários para sobreviver.

(Foto em destaque: sessão da comissão especial que aprovou o Estatuto da Família, em 24/09/2015. Gilmar Felix/Câmara dos Deputados.)

Movimentos sociais no planalto pela continuidade institucional

Movimentos sociais se reuniram ontem (13) no Palácio do Planalto com a presidente da República, Dilma Rousseff e com o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto. No evento, chamado Diálogo com os Movimentos Sociais, a tônica foi a da defesa da continuidade do mandato de Dilma até 2018 e pelo aprofundamento das mudanças introduzidas nos governos petistas.

A presidente Dilma Rousseff participa do evento Diálogo com os Movimentos Sociais, no Palácio do Planalto. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
A presidente Dilma Rousseff participa do evento Diálogo com os Movimentos Sociais, no Palácio do Planalto. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Os movimentos sociais também demarcaram as diferenças com os que pretendem interromper o mandato de Dilma Rousseff. Guilherme Boulos, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, chamou-os de “golpistas que se utilizam da insatisfação social para impor o seu projeto político e para atacar a democracia”. Segundo Carina Vitral, presidente da UNE, “para ter impeachment precisa ter crime de responsabilidade, e sabemos que, contra a presidenta, não há qualquer indício ou acusação”. O presidente da CUT, Vagner Freitas, disse que “o que se vende hoje no Brasil é a intolerância, o preconceito de classe contra nós. Somos defensores da unidade nacional, de um projeto nacional.”

Pautas sociais

Por outro lado, projetos de interesse dos movimentos sociais também foram debatidos. Raimundo Bonfin, da Central dos Movimentos Populares afirmou que o governo “tem de taxar as grandes fortunas e combater de forma dura a sonegação fiscal”, fazendo menção ainda a manifestações ocorridas este ano em que a sonegação fiscal foi defendida pelos opositores: disse que songação “é corrupção, sim, porque tira dinheiro dos programas sociais e do desenvolvimento econômico.” Também foi defendida a universalidade do Sistema Único de Saúde, o orçamento da educação, o programa Minha Casa, Minha Vida, os povos e comunidades tradicionais.

Por outro lado, foi criticada a “Agenda Brasil“, proposta pelo presidente do Senado Federal, Renan Calheiros. Também foram criticados o presidente da Câmara dos Deputados e a política econômica — personificada no ministro da Fazenda, Joaquim Levy: “Fora já, fora já daqui, o Eduardo Cunha junto com o Levy”, repetiam os presentes.

Senadores independentes

Em outra frente política, também ontem os senadores independentes Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), Cristovam Buarque (PDT-DF), João Alberto Capiberibe (PDT-AP), Lídice da Mata (PSB-BA) e Lasier Martins (PDT-RS) se reuniram com Dilma Rousseff e defenderam a formação de um governo de união nacional. Na ocasião, Dilma elogiou o papel do Senado na crise atual, afirmando que a casa legislativa tem agido como “poder moderador”.

Opinião de Visão Católica

Tanto os movimentos sociais quanto os senadores do PDT, do PSB e até do PSOL defenderam “união nacional”. Mas, sempre de acordo com os seus interesses. Os movimentos sociais, por exemplo, têm acirrado em seu discurso a divisão de classes — que, embora exista e seja vista nas manifestações de rua que vêm ocorrendo ao longo do ano, não tende a produzir bons frutos, ao contrário, pode ter um resultado bastante danoso à democracia e aos interesses dos próprios movimentos sociais. O acirramento dos conflitos políticos tem evidentemente produzido intolerância (como eles mesmos denunciaram), até mesmo com atentados com bombas incendiárias contra sedes do PT e do Instituto Lula.

A violência tem crescido na política brasileira, e está presente especialmente nas manifestações da oposição, com bonecos enforcados, ameaças de magnicídio e atentados terroristas (porque as tentativas de incendiar sedes de instituições adversárias é terrorismo na sua acepção mais pura). E deve ser combatida. Porém, é aconselhável que o combate não se dê pelo acirramento dessa clivagem, já tão danosa, e o discursos dos movimentos sociais têm que ficar atentos a isso. Se pregam a união nacional, então, mesmo demarcando diferenças, não devem seguir verbalmente o caminho que os opositores têm seguido também materialmente.

As falas dos movimentos sociais podem ser lidas com mais detalhes na Agência Brasil.

CNBB é contra a redução da maioridade penal

Após a aprovação da redução da maioridade penal pela comissão especial da Câmara dos Deputados que analisava a matéria (PEC 171/1993), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) reiterou seu posicionamento contrário à medida. “Poderá haver um ‘efeito dominó’ fazendo com que algumas violações aos direitos da criança e do adolescente deixem de ser crimes como a venda de bebida alcoólica, abusos sexuais, dentre outras” – diz a nota.

Cartaz
Cartaz da Pastoral da Juventude da CNBB contra a redução da maioridade penal.

Para o relator da PEC 171/1993, Laerte Bessa (PR-DF), a redução vem responder a um “clamor” da sociedade gerado pela eventual cometimento de crimes hediondos. A nota da CNBB, porém, adota um tom mais conseqüente:

A comoção não é boa conselheira e, nesse caso, pode levar a decisões equivocadas com danos irreparáveis para muitas crianças e adolescentes, incidindo diretamente nas famílias e na sociedade. O caminho para pôr fim à condenável violência praticada por adolescentes passa, antes de tudo, por ações preventivas como educação de qualidade, em tempo integral; combate sistemático ao tráfico de drogas; proteção à família; criação, por parte dos poderes públicos e de nossas comunidades eclesiais, de espaços de convivência, visando a ocupação e a inclusão social de adolescentes e jovens por meio de lazer sadio e atividades educativas; reafirmação de valores como o amor, o perdão, a reconciliação, a responsabilidade e a paz.

Deputados comemoram aprovação da redução da maioridade penal.
Deputados comemoram aprovação da redução da maioridade penal, apesar de o povo ter sido impedido de assistir à seção. (Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados)

Após aprovar por 21 votos a 6 a redução da maioridade penal para crimes hediondos (anteontem, 17), a Câmara dos Deputados deverá votar a proposta em plenário em primeiro turno no dia 30. A população ficou do lado de fora da sala onde ocorreu a votação na comissão especial. No dia anterior (16), o IPEA divulgara estudo que demonstra os erros do relatório favorável à redução da maioridade, agora aprovado.

O povo ficou fora da discussão da PEC 171/1993, que prevê a redução da maioridade penal. Na foto, o espaço em que ficaram confinados os manifestantes, em um corredor da Câmara dos Deputados. (Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados)
O povo ficou fora da discussão da PEC 171/1993, que prevê a redução da maioridade penal. Na foto, o espaço em que ficaram confinados os manifestantes, em um corredor da Câmara dos Deputados. (Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados)

Partidos que orientaram os deputados a votar pela redução da maioridade penal: PMDB, PSDB, DEM, PR, PP e PTB.

Partidos que orientaram os deputados a votar pela manutenção da idade atual (e punição conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente): PT, PSB, PPS, PDT e PCdoB.

Agenda de Eduardo Cunha

A atividade legislativa da Câmara dos Deputados tem sido marcada pelos interesses de seu presidente, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O primeiro projeto que ele fez passar foi o que estendia a terceirização às atividades-fim das empresas, depois uma reforma política originada na própria Câmara (cuja votação foi encerrada dia 17). Agora, a redução da maioridade penal, e, como já foi anunciado, em breve a proibição de que municípios recebam encargos sem que se especifique uma transferência de recursos correspondente.

(Com agradecimento a Últimas da Redação)

PR: Ministério Público investigará massacre; ajude!

O Ministério Público do Paraná investigará o massacre ocorrido ontem (29) contra manifestantes na praça Nossa Senhora de Salete, no Centro Cívico de Curitiba. Pelo menos 200 pessoas ficaram feridas, 40 hospitalizadas, sendo 8 em estado grave. 14 manifestantes foram presos, mas não têm seus nomes revelados, nem é permitido que advogados auxiliem eles, em flagrante desrespeito aos direitos mais básicos do ser humano e à Constituição Federal. 20 a 50 policiais que se recusaram a participar do massacre teriam sido presos, mas não há informações oficiais. Crianças também foram atingidas, inclusive nas creches da região. Órgãos públicos e empresas tiveram que dispensar seus funcionários em decorrência do abuso do gás lacrimogênio. O barulho das bombas era ouvido até no Pilarzinho, bairro no norte de Curitiba.

O próprio Ministério Público havia expedido, pela manhã, a recomendação n.º 1/2015, para que se evitasse a violência por parte das autoridades públicas. A nota dizia:

a) garantam o direito à realização de manifestações públicas e pacíficas nos arredores da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná, a partir do livre acesso àquele espaço público, sem prejuízo do livre e regular funcionamento do Parlamento;

b) no acompanhamento da realização de manifestações pacíficas nelas não intervenham, salvo para assegurar a segurança de seus participantes ou para conter a prática de infrações penais, sendo certo que, neste caso, a atuação deve incidir tão somente em relação ao indivíduo que estiver cometendo o ilícito;

c) havendo a necessidade de atuação repressiva da Polícia Militar, observem os meios adequados e proporcionais de contenção, evitando-se o uso de qualquer espécie de armamento (não letal ou letal), salvo em caso de necessidade inafastável;

[…]

f) seja garantido o acesso de representantes da sociedade civil no acompanhamento dos trabalhos legislativos, na medida em que o espaço comporte, e sem prejuízo da ordem interna dos trabalhos;

Nada disso foi cumprido. Por isso, o Ministério Público instaurou procedimento para investigar os abusos da força policial e descobrir os responsáveis. Quem puder auxiliar com depoimentos, documentos, imagens ou vídeos da violência deve procurar os promotores de Justiça Paulo Sérgio Markowicz de Lima e Maurício Cirino dos Santos na Procuradoria-Geral de Justiça, rua Marechal Hermes, 751, Centro Cívico (atrás do Palácio Iguaçu e ao lado do Museu Oscar Niemeyer).

Entre os abusos constatados ontem, o prefeito de Curitiba, Gustavo Fruet (PDT), informou que as ambulâncias não conseguiam chegar ao local. Outras pessoas informavam que, as que eventualmente chegaram, foram alvo de bombas disparadas pela polícia. Pessoas que tentavam socorrer os feridos foram também alvo de tiros, bombas e cachorros policiais. Entre os feridos por cada um desses motivos estão um cinegrafista da CATVE, um da TV 15 e um da Band, respectivamente. O equipamento de filmagem da TV 15 ficou destruído pela bomba, jogada do helicóptero policial. Três pessoas testemunharam as bombas sendo jogadas do helicóptero, inclusive a Senadora Gleisi Hoffmann (PT), que estava em missão do Senado Federal para tentar evitar o massacre. Isso aparece também em ao menos um vídeo.

O governador Beto Richa (PSDB) afirmou que a ação policial teria ocorrido em resposta a vândalos e “black blocks”, que no entanto não aparecem em nenhuma imagem gravada no local. O governo do estado afirmou ainda que os presos seriam “black blocks” e que não haveria professores entre eles. Nota da APP Sindicato desemente:

“Pelo menos três professores conhecidos meus, um de Maringá e dois de Curitiba, estão detidos”, afirma o secretário de Assuntos Jurídicos da APP, Mário Sergio Ferreira de Souza. Segundo ele, nas delegacias os advogados estão sendo impedidos de conversar com os detidos.

“Além disso, eles se negam a dar os nomes de quem foi detido. Estamos vivendo, no Paraná, um total desrespeito ao Estado Democrático de Direito. O novo tirano das Araucárias se chama Beto Richa”, descreve Mário Sérgio.

De acordo com o diretor da APP, o Jurídico da entidade – em conjunto com a seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Defensoria Pública – irá elaborar uma ação criminal contra o governador do Estado, o secretário de Segurança Pública e a cúpula da Polícia Militar (PM) do Paraná.

Atualização: A Senadora Gleisi Hoffmann (PT) escreveu ontem à noite em sua conta no Facebook:

Nada justifica a violência que presenciei hoje no Centro Cívico de Curitiba. Eu sou testemunha. Estava na porta da Assembléia com o Senador Roberto Requião [PMDB] conversando com os deputados, quando começamos a ouvir as bombas estourarem sem que ninguém tentasse entrar no local. Eu também andei no meio do povo, ninguém estava fazendo resistência e as bombas continuavam. Isso não faz parte da nossa história, não faz parte da democracia e do respeito que temos que ter com os movimentos.

Mais de 200 pessoas ficaram feridas. Vamos levar esse relato para o Senado, até porque não viemos aqui só como senadores do Paraná. Viemos representando o Senado Federal e vamos deixar registrada a vergonha que vimos aqui. É um absurdo que o governador não tenha tido o mínimo de sensibilidade para fazer a negociação.

Atualização 2: a rádio curitibana Banda B divulgou entrevista do comandante-geral da PM, onde ele supostamente isenta de culpa o secretário de segurança, Francisco Francischini, da violência ocorrida (e tenta igualar manifestantes e policiais, apesar de todas as imagens dizerem que os manifestantes não agrediram a polícia em momento algum). O comandante César Kogut disse:

O secretário observou de longe e não participou em momento algum das ordem dada a nível de campo. Os comandantes, junto com a tropa que estava no local, agiram de momento e não tivemos interferência dizendo faça isso ou aquilo

Ou seja, ele afirma que tudo foi uma ação espontânea dos militares envolvidos, eximindo-se também de qualquer culpa. Porém, ninguém tomou providências para parar o massacre, o que os coloca ao menos como cúmplices dos crimes cometidos pelos policiais. As imagens, contudo, demonstram uma ação organizada e premeditada por parte da Polícia Militar do Paraná, certamente autorizada ou determinada por seus chefes (Kogut, Francischini e Richa). Todos os policiais começam e terminam juntos as ações violentas, não há nada espontâneo, da “tropa que estava no local”.

Opinião de Visão Católica

Ontem Visão Católica já alertava para os crimes cometidos pelo governador Beto Richa (PSDB). Já na terça-feira afirmava que o governador promovia uma guerra contra o povo, e ontem repercutia informação dada a Esmael Morais, de que ” o subcomandante-geral da PM, coronel Nerino Mariano de Brito, ‘quer sangue’, segundo informam policiais”. Também ontem divulgava que o deputado Tadeu Veneri (PT) havia pedido a organismos internacionais que investigassem as violações de direitos humanos. O massacre de 29/4 foi anunciado. Beto Richa, responsável por ele, incorreu em crimes e deve ser punido conforme a lei. Ele inclusive não fala em investigar eventuais abusos: ao contrário, dá respaldo total à ação, na verdade orquestrada com o seu consentimento.

Depoimento

Estou a 1.300 Km do massacre, mas com o coração dilacerado. Nasci em Curitiba, e a praça Nossa Senhora de Salete, no Centro Cívico da cidade, faz parte dos primeiros 22 anos da minha vida. Lá aprendi a andar de bicicleta. Meu primeiro tombo foi perto de onde está hoje a rótula junto à prefeitura de Curitiba, onde foi socorrida a maior parte dos feridos. Se ia de ônibus à casa de minha avó paterna, passava pelo meio da praça, no veículo da linha Boqueirão-Centro Cívico. O caminho do Ahu ao centro da cidade muitas vezes era feito por ali. Quando voltava de bicicleta da faculdade, desviava pela rua que passa atrás da Assembléia (para não andar na contramão), indo da rótula da prefeitura à outra, entre a praça Cabeza de Vaca (atrás do Palácio Iguaçu, sede do governo estadual) e o Ministério Público do Paraná. Muitas vezes simplesmente caminhava por lá para apreciar a beleza da natureza e da arquitetura modernista, projetada para a comemoração do centenário da emancipação do Paraná, em 1953. Foi ali que aprendi a me manifestar, e aprendi também que a polícia estava lá para desviar o trânsito e para garantir nossa segurança. O direito à manifestação era constitucional, diziam (e eu conferi).

Mas, Beto Richa revogou a Constituição Federal. Acabou com o habeas corpus (nem as decisões judiciais permitindo a entrada na ALEP foram cumpridas) e com o direito à livre manifestação de opiniões. Acabou com o princípio constitucional da proporcionalidade. Acabou com o direito à dignidade humana, à integridade física e moral. Não disse nem sequer “esvaziem a praça a qualquer custo”. Ele disse: “esvaziem a praça a todo custo“. Até mesmo crianças foram atingidas. Quem tentava socorrer os feridos foi atingido. Quem filmava os acontecimentos foi atingido. Quem apenas estava ali, dizendo o que pensava, foi atingido. Todos nós, seres humanos, irmãos e irmãs no sangue, no batismo, na humanidade fomos atingidos. Quem estava lá eram meus amigos, meus conhecidos, meus colegas de faculdade. Posso ter seguido outros rumos após concluir o curso de bacharelado e licenciatura em História na UFPR. No entanto, sou professor. Meu corpo está longe, mas as bombas explodiram na minha alma.

(Imagem destacada: massacre na praça Nossa Senhora de Salete, 29/04/2015 — Pragmatismo Político)

PR: desvio de recursos pode custar caro ao estado; pedida investigação de violações de direitos humanos

Audiência pública realizada ontem (28) na Câmara dos Deputados teve como tema principal o uso dos recursos da Paraná Previdência. Foram ouvidos o ministro da Previdência, Carlos Eduardo Gabas, e o idealizador da Paraná Previdência, Renato Folador, ambos contrários ao desvio de recursos do Fundo Previdenciário. (Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados)
Audiência pública realizada ontem (28) na Câmara dos Deputados teve como tema principal o uso dos recursos da Paraná Previdência. Foram ouvidos o ministro da Previdência, Carlos Eduardo Gabas, e o idealizador da Paraná Previdência, Renato Folador, que alertaram sobre os riscos do desvio de recursos do Fundo Previdenciário, pretendido pelo governador Beto Richa (PSDB). (Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados)

O estado do Paraná não receberá mais transferências voluntárias da União se o projeto imposto pelo governador Beto Richa (PSDB) à sociedade paranaense for considerado ilegal pela autarquia que regulamenta os fundos de pensão, a Previc, segundo informações prestadas pelo ministro da Previdência, Carlos Eduardo Gabas à Câmara dos Deputados na tarde de ontem (28). Richa quer desviar R$ 125 milhões mensais do Fundo Previdenciário da Paraná Previdência para pagar benefícios previdenciários antigos, de responsabilidade do governo estadual — com isso, o fundo, que hoje é superavitário em R$ 39,5 milhões, se tornará deficitário em R$ 85 milhões, o que implicará acabar com a previdência dos servidores em cerca de 8 anos. O que causará problemas terríveis ao povo paranaense no mandato do próximo governador. Richa, em segundo mandato, não poderá disputar nova reeleição.

A sanção ao governo estadual está prevista na legislação e implicará a suspensão dos repasses feitos pelo governo federal para projetos do governo do estado. Somente de janeiro a abril de 2015, o governo do Paraná já recebeu R$ 898 milhões nesses repasses, ou seja, mais que o dobro do que se pretende economizar em um período equivalente. “Se o governo vai continuar com a proposta e com a votação, é uma decisão do governo. Se posteriormente essa medida for declarada ilegal, terá de se rever o que foi votado na Assembleia”, informou Gabas.

Projeto ilegal

Ainda segundo o ministro, o projeto inicial, apresentado pelo governo Richa em fevereiro, foi considerado ilegal — ele pretendia fundir o Fundo Previdenciário, superavitário, que paga os benefícios mais novos, e o Fundo Financeiro, que paga os benefícios antigos e que depende dos recursos enviados ao governo do Estado. O novo projeto, apesar de não fundir os fundos, determina que o Fundo Previdenciário seja o pagador do Fundo Financeiro, em lugar do governo do Estado — ou seja, o governo estadual pretende repassar a responsabilidade por parte de sua folha de pagamento ao Fundo Previdenciário, que é mantido pelas contribuições previdenciárias pagas sobre o salário dos servidores ativos. Em resumo, Beto Richa quer eximir o governo estadual da responsabilidade pelo pagamento das aposentadorias e pensões antigas.

O governo do Paraná submeteu o novo projeto à apreciação dos órgãos competentes, mas não esperou o resultado da análise para enviá-lo à Assembléia Legislativa (ALEP), nem para exigir a rápida conclusão da votação, ferindo a independência do poder legislativo. Sobre isso, Gabas afirmou: “Quando você pergunta alguma coisa, normalmente você espera a resposta para tomar uma decisão.” Essa decisão ainda não foi tomada porque as informações prestadas pelo governo Richa foram incompletas e o estado cancelou as reuniões agendadas para complementá-las.

Direitos humanos

Ontem, o deputado estadual Tadeu Veneri (PT) informou que enviou uma denúncia sobre violações de direitos humanos no cerco à Assembléia Legislativa. Houve violação de direitos fundamentais e uso excessivo da força policial, segundo o deputado. Já o Senado Federal envia hoje (29) uma comissão parlamentar para acompanhar o tratamento recebido pelos manifestantes. A iniciativa é dos senadores Gleisi Hoffmann (PT) e Roberto Requião (PMDB).

Já na Polícia Militar do Paraná houve mudanças, com a troca do comando repressivo. O coronel Chehade Elias Geha foi substituído, no comando das operações, pelo corregedor da PM, tenente-coronel Arildo Luiz Dias. Conforme o blogueiro Esmael Morais, “a mudança no comando da PM não significa que a repressão [não] se repetirá nesta tarde. Pelo contrário, pois o subcomandante-geral da PM, coronel Nerino Mariano de Brito, ‘quer sangue’, segundo informam policiais”.

Ameaças a deputados e compra de votos

O mesmo blogueiro publicou áudio em que o deputado estadual Cobra Repórter (PSC) fala da chantagem do governador Beto Richa (PSDB) aos deputados estaduais: “se eu me posicionar na oposição, esse cara (Beto Richa) não me dá nada, nem um papel de bala”, diz o deputado na gravação. O que também indica o tipo de política realizado pelos deputados que votam a favor do governo, baseado na promessa de recursos que favoreçam seus eleitores (algo muito próximo da compra de votos).

Dom Raymundo Damasceno: sim à reforma política, não à ditadura e ao impeachment

O cardeal arcebispo de Aparecida (SP), Dom Raymundo Damasceno Assis, concedeu recente entrevista ao Diário de Pernambuco, na qual esclarece diversas questões, mas especialmente se posiciona em relação às questões políticas levantadas por diferentes setores da sociedade.

A entrevista, publicada dia 23, começa pela reafirmação, pelo cardeal, de que a comunhão para divorciados que contraiam uma segunda união continuará vetada, a menos que obtenham a declaração, em um tribunal eclesiástico, de que a primeira união era nula. “Teremos que ver caso a caso. Certamente, o sínodo [dos bispos sobre a família] não tomará nenhuma decisão de caráter genérico”, declarou.

Sobre a corrupção, o cardeal afirmou:

Corrupção sempre existiu em toda parte. E continuará existindo porque faz parte da pecaminosidade da humanidade, mas isso não justifica aceitá-la. Temos que combatê-la rigorosamente e com muita severidade através dos instrumentos que o estado dispõe: a polícia, o Judiciário, o próprio Congresso Nacional. Nos opomos à corrupção, pois é uma das formas de injustiça, sobretudo no campo social.

Sobre o momento atual, disse que “vivemos uma crise moral e ética, mas as crises não devem ser vistas como momento negativo. Podem ser o momento oportuno para a gestação de algo novo, de renovação, de purificação.” Um caminho de conversão, portanto. E aponta um instrumento fundamental para percorrer esse caminho:

A CNBB, conjuntamente com um grande número de entidades da sociedade civil organizada, elaborou uma proposta de reforma que pessoas estão confundindo como uma proposta do PT e de cunho bolivariano. Nada disso. É uma proposta com o apoio de vários partidos e com ela queremos provocar um debate na sociedade. Como vemos na Lava-Jato, é muito dinheiro que correu e corre nas campanhas eleitorais e que facilita a corrupção.

E ele também esclareceu que são quatro os pontos-chave dessa reforma:

  1. Financiamento público das campanhas (com o impedimento de empresas financiarem as campanhas eleitorais).
  2. Maior representação das mulheres, que são a maioria do eleitorado, mas com pouca representatividade nos cargos públicos.
  3. Regulamentação dos instrumentos constitucionais de democracia direta (plebiscito, referendo e projetos de lei de iniciativa popular).
  4. Votação em dois turnos para deputados e vereadores. “Primeiro, a votação no partido e no projeto. Depois, nos candidatos, apresentados em lista pelos partidos.”

Cabe lembrar que hoje o eleitor vota no candidato a vereador ou deputado, mas o voto é computado para o partido ou coligação.

Também a questão de que alguns grupos promovem um golpe militar foi abordada. Dom Raymundo foi taxativo: “É preferível a pior democracia à melhor das ditaduras. […] Não queremos ditadura nem golpe militar.” E prosseguiu:

Creio que isso não está em questão nem para os militares nem para a maioria da sociedade. Quem fez essa experiência não quer repetir. E para o impeachment não há motivo e fundamento, como afirmou o Supremo Tribunal Federal. Não há motivo para que seja iniciado um processo de impeachment. Por enquanto, a presidente está exercendo o mandato e parece não haver nenhum fato que a comprometa do ponto de vista ético e moral. Nesse momento é fundamental o diálogo.

Ao final, foi abordada a campanha da fraternidade 2015, que traz o lema “Eu vim para servir” (Mc 10,45). “A missão da Igreja é servir, a exemplo de Jesus Cristo”, disse ele. E prosseguiu: “E esse serviço deve ser prestado pelo leigo porque ele é a presença da Igreja no coração do mundo. Ele deve fazer da sua profissão, do seu trabalho um serviço aos outros. E mais ainda na política. O papa Paulo VI dizia que a política é uma das formas mais sublimes da caridade.”

(Clique aqui para ler a entrevista completa. Foto de destaque: Wilson Dias/ABr)